Foto:Evandro Veigacorreio/reprodução
Primeira mulher eleita prefeita de Salvador e a primeira a ser senadora pelo estado, Lídice da Mata (PSB) tenta este ano, mais uma vez, chegar antes das outras mulheres em um cargo público. Quer ser governadora da Bahia. No caminho, tem dois adversários que aparecem com larga vantagem, de acordo com as pesquisas de intenção de votos divulgadas até aqui sobre a sucessão – o ex-governador Paulo Souto (DEM) e o deputado federal Rui Costa (PT). Para superar a desvantagem, Lídice aposta na força da candidata à Presidência pelo PSB, Marina Silva, e na própria história.
Todas as pesquisas de intenções de voto divulgadas lhe colocam fora de um eventual segundo turno. O que a senhora pretende fazer nesta reta final para modificar este cenário?
O que já estamos fazendo é intensificando a campanha. Nós temos consciência do peso financeiro que esta campanha teve, do uso do poder econômico como nunca foi visto antes. Além disso, passamos quase um mês parados. Foram 10 dias em função da perda de Eduardo Campos, mais 15 dias para constituir um novo comitê financeiro. Até que houvesse captação de recursos e a distribuição para os estados, a gente perdeu muito tempo. A gente ficou com uma campanha quase paralisada em um momento fundamental, no início do horário eleitoral.
Por outro lado, aconteceu a ascensão de Marina Silva. Isso não ajudou?
Não existe este casamento. Se você verificar o que se passou em todos os estados, vai perceber que em nenhum deles houve uma relação entre o desempenho dela e o dos candidatos a governo.
Ela não conseguiu transferir votos para ninguém?
Não é transferir, é que são dois movimentos descasados. Marina cresce primeiro com o eleitor que esperava que ela fosse candidata e se frustrou quando não conseguiu ser. Esse é um eleitor dela, que teve 20 milhões de votos em 2010. Aconteceu este reencontro. Além disso, houve uma comoção por causa de Eduardo. Esses dois movimentos estão dissociados de qualquer outro. Não dá para relacionar isso com a campanha na Bahia, que tem um histórico de dependência do governo federal, e numa disputa absolutamente definida. Você tem de um lado o PT, com toda a sua carga e a força de um governo, que é a única força capaz de penetrar em todos os cantos do interior do estado. Do outro lado, você tem os velhos poderosos, amparados no recall (lembrança) de anos do carlismo, somado à Prefeitura de Salvador, que significa máquina, recursos financeiros. É o único estado em que o DEM tem chance de eleger um governador, o que desperta um interesse nacional. Então, não há um casamento, que seria muito mais fácil com Eduardo, que vinha crescendo de maneira sustentável, à medida em que se tornava conhecido. Marina, não.
Neste sentido, qual é a expectativa da senhora para a eleição em 5 de outubro?
Nós vamos continuar lutando para chegar ao segundo turno. A nossa campanha está em um bom ritmo. A posição de Marina, com todas as chances de chegar ao segundo turno, intensificou mais a campanha do PT, uniu todos e levou a um ritmo de confronto que se repetiu embaixo. Eles (o PT) preferiram polarizar com Paulo Souto, que não tem um candidato à Presidência forte, do que polarizar comigo, que tenho Marina no páreo. Essa é uma estratégia claramente definida pelo PT, e com força para definir o jogo, porque tem o poder de interferência na mídia, nas organizações sociais que estão no governo. A campanha de criar uma ideia falsa sobre Marina está em todas as áreas. Está se tentando criar uma imagem falsa, de fragilidade, de que ela muda o que diz. Ora, Dilma disse que jamais retiraria (o ministro) César Borges do governo dela, mas o que foi que fez? Teve que ceder e colocar ele em um ministério inferior, entre aspas, ao que estava antes (saiu da pasta dos Transportes para a de Portos). Tirou caladinha e ninguém disse que Dilma era indecisa. Quantas vezes Dilma disse uma coisa e desdisse no exercício do governo? Aí não é indecisa. Agora, se Marina diz uma coisa e faz uma observação a respeito do que disse, ‘ah, mudou de ideia’. É uma canalhice a forma como está se conduzindo a campanha no Brasil contra Marina.
Marina trouxe para a campanha uma expressão que acabou sendo utilizada inclusive por adversários dela...
A nova política. Aí você vê o PT falar em nova política e velha política...
Pois é, mas o que chama a atenção nesse processo é que o termo é novo, mas as caras são as mesmas. São os mesmos nomes que a sociedade já conhece. Qual é a novidade, então?
Primeiro que não são os mesmos rostos. Nós temos Marina.
Marina foi candidata há quatro anos, foi ministra, senadora...
Sim, mas nova política não quer dizer necessariamente uma pessoa nova que aparece no cenário. Até porque numa campanha de presidente da República, esse novo não seria conhecido e nem teria votos. Nós queremos uma nova forma de fazer política. A nova política não se reduz a uma briga entre o PT e o PSDB, numa polarização que há 20 anos vem marcando a política brasileira. Nós precisamos de uma nova estratégia, de um novo posicionamento, que não reduza tudo a um maniqueísmo, onde tudo o que vem do PSDB é ruim e tudo o que vem do PT é bom. Nem tudo do PSDB é ruim, nem do PT é bom. Ou, por um acaso, a estabilidade econômica foi ruim para o Brasil? Não foi. Lula manteve a estabilidade, os pilares da política econômica. O PT tem a incapacidade de analisar os seus erros e refazer os caminhos e o PSDB, do mesmo modo. Quando eles não falam entre si, ninguém ouve a sociedade e o resultado é o que aconteceu em 2013, quando a juventude na rua não era uma coisa nem outra e o povo colocou as suas plataformas para discussão. E Dilma dizer que viu com muito interesse? Ninguém viu com interesse, todos viram com preocupação, porque não conseguiram identificar o movimento antes. Vamos tirar essa máscara do período eleitoral, de que somos todos perfeitos e poderosos, e vamos discutir com a sociedade de maneira franca, inclusive nossos possíveis erros. Nós trocamos uma disputa de super-homens por uma disputa de supermulheres. Marina não pode chorar. Lula chorou e todo mundo disse que era sinal de sensibilidade, Marina chorou, se sentindo magoada e agredida, e é fraca. Nunca vi coisa mais machista.
A imprensa noticiou uma declação da senhora de que, se eleita, pretende governar com o melhor do DEM e do PT...
Isso não quer dizer que eu vou fazer um governo com a participação do DEM e o PT. Eu falei de políticas. Eu vou manter toda a política pública que resultou em gastos de dinheiro público e em benefício para a população. O mais importante é que eu vou fazer aquilo que eles não fizeram. Farei o que em 20 anos nem o PT e nem o DEM fizeram. Chegaram a dizer que eu queria resgatar o carlismo, não é nada disso. Para isso eu não precisaria ser eleita, o PT já resgatou. Eu enfrentei o carlismo sozinha, com a população, não é o enfrentamento que Wagner faz com o estado na mão e a ajuda do governo federal.
O que a senhora considera o melhor de cada um e o que será absorvido em um eventual mandato seu?
Do PT, o rompimento de uma política de perseguição aos adversários. Se é que rompeu mesmo. Quero consolidar uma relação republicana. Isso não está consolidado nas práticas governamentais de hoje. Isso é a nova política. O diálogo iniciado entre o governador e o prefeito na cidade foi um enorme avanço. É isso o que eu quero do processo. Do carlismo? Nem sei, vou olhar o que tem. O SAC, por exemplo, não vou destruir porque foi criado por Paulo Souto. Conceito político eu tenho o meu, que é diferente dos dois. Eu vou tirar a comunicação de atividade meio e vou transformar em atividade fim. Será responsável por implantar ferramentas de participação do governo e vai agregar a ouvidoria pública. São políticas de quem não quer usar comunicação só para o marketing. Isso foi tão criticado no DEM pelo PT, mas hoje acontece a mesma coisa.
O seu partido esteve em sete dos oito anos de governo. Isso lhe causou alguma dificuldade em se colocar como opção ao atual projeto?
Não, nenhuma dificuldade, nenhum constrangimento porque eu nunca fiz ataques pessoais, nem agressões a ninguém, que não é meu estilo de fazer política. Participamos do governo dentro de uma proposta. O que Eduardo (Campos) fez foi refletir sobre os erros da política econômica atual e outros erros administrativos e buscar uma saída do campo político progressista para impedir que a reação aos erros levasse à vitória de uma candidatura fora do contexto que está sendo debatido. A sociedade brasileira vem se aperfeiçoando no caminho democrático, o que é ruim é as forças políticas acharem que o caminho democrático só serve para elas. Quando qualquer outro tem a possibilidade de chegar ao poder, coloca-se como ameaça à democracia, como o PT tenta fazer com Marina.
Pensando na eleição para o governo, em um eventual segundo turno o seu apoio a Rui Costa será automático, levando em conta a proximidade ideológica?
Nada é automático. Nós vamos conversar, é um processo de discussão política. Eu vou lutar até o fim para ir para o segundo turno e creio que numa campanha em que há chances de Marina chegar ao segundo turno isso não é impossível. Por isso nós vamos lutar e continuar lutando até o último minuto. E tem mais, eu não vou discutir segundo turno antes dele acontecer.
Muita gente tem recordações negativas de seu período à frente da Prefeitura de Salvador. Tem alguma coisa que a senhora pensa em fazer diferente em um eventual governo seu?
Quanto tempo faz que eu saí do governo? Já se passaram 28 anos que eu entrei no governo. Muito tempo se passou. E tem uma outra coisa, a minha experiência administrativa foi marcada pela perseguição política. Veja bem, você diz ‘algumas pessoas’ e pode ser que elas tenham se deixado levar pelo massacre da mídia, o cerco financeiro, mas quem vai comigo em qualquer lugar dessa cidade e é recebido em qualquer segmento de renda com o carinho que eu sou recebida não tem nada que olhar para trás com ressentimentos. A cidade tem dimensão do que foi o meu governo. Eu me emociono ao ver a reação do povo. Primeiro, olham até de cara feia, pensando que é um político qualquer, mas depois percebem que é Lídice e eu sou muito bem recebida. Foi uma gestão que, apesar de todo o bombardeio, nunca teve escândalo.
A gente está encerrando um período eleitoral longo, cansativo e caro, enquanto as pessoas estão começando a se preocupar com a eleição agora. Qual é a sua opinião a respeito do modelo político brasileiro?
Eu acho a campanha curta. É isso o que leva o povo a se afastar. Por isso o povo se assusta, de uma hora para outra tem 300 candidatos diante dele pedindo votos. Os candidatos e os partidos precisam definir suas candidaturas em duas fazes. Se a campanha começa um ano antes, todos os candidatos à Presidência da República terão tempo para percorrer o país, não vão precisar de aviões particulares. Vão poder conversar com o povo em aviões de carreira.
Mas essa campanha mais longa não vai tornar a campanha ainda mais cara?
Não, de maneira nenhuma. Eu acredito que o modelo atual é o que encarece. Imagine o que é um candidato tentar se apresentar para o país ou para um estado do tamanho da Bahia em tão pouco tempo. Isso não só é dificílimo, como é uma porta aberta para a corrupção. Olhe o que foi a negociação do tempo de televisão nesta campanha. Foi uma coisa escandalosa. A minha teve um minuto e cinquenta e um segundos, as outras tiveram dez minutos e cinco minutos. Isso desfaz a igualdade de condições. Eu não concorro em igualdade com ninguém. Alias, nenhum de nós está concorrendo igualmente. Um deles saiu do governo há quatro meses. Foi secretário até a última hora. Isso é um absurdo. Uma reforma política não pode permitir isso. É um modelo que fortalece a perpetuação no poder de quem já está lá. A democracia prevê uma situação completamente diferente dessa. É preciso que quem não está no poder tenha a possibilidade de chegar. De outro modo não é democracia. Eu sou a favor do debate político amplo e democrático, para que o povo brasileiro escolha o caminho dele. O que eu entendi da luta contra a ditadura militar foi que o Brasil fez uma escolha pela democracia. É isso o que eu defendo.
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