Apesar de já estar aposentado, o juiz Rosalino dos Santos Almeida responderá a mais quatro processos administrativos disciplinares no Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA). Os processos foram abertos na última sessão plenária, ocorrida na última quarta-feira (9), após pressão do Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Rosalino foi magistrado por quase 30 anos em Paulo Afonso, no norte da Bahia. Os processos corriam o risco de não serem analisados na data por falta de quórum. O presidente do TJ, desembargador Lourival Trindade, chegou a pedir para alguns desembargadores não se ausentarem da sessão.
O relator dos procedimentos, desembargador José Alfredo, corregedor geral de Justiça, alertou sobre os prazos exigidos pelo CNJ, que findariam no dia 6 de julho. A partir de agora, serão relatores dos processos os desembargadores Regina Helena, Ivone Bessa e Luiz Fernando Lima.
No dia da sessão, o advogado do caso, Antonio Fernando Dantas Montalvão, chegou a pedir a suspeição do corregedor, por ter agido, supostamente, com parcialidade e por ter vazado informações sobre o caso para a imprensa. A suspeição foi rejeitada pelos desembargadores. Para o magistrado, o pedido de suspeição foi uma surpresa. O corregedor afirmou que a instrução do caso está encerrada desde o ano passado e que o advogado poderia ter arguido a suspeição logo no primeiro momento, não depois da instrução. Desde 2020 o processo estava pautado para ser analisado pelo Pleno do TJ-BA, mas constantemente era adiado.
Os relatórios lidos pelo corregedor indicam diversos crimes praticados pelo magistrado que se aposentou em março de 2020. Um dos fatos era o suposto direcionamento da distribuição de processos para a 1ª Vara Cível de Paulo Afonso, onde atuava. Ele também teria modificado valores indenizatórios, sendo que, em dois casos, os valores iniciais eram de R$ 38 mil e R$ 65,8 mil e foram atualizados para R$ 1,8 milhão e R$ 2,4 milhão, respectivamente, a serem pagos pelo Banco do Brasil em favor dos autores da ação, com saques autorizados por decisão de primeiro grau. Rosalino ainda é acusado de adotar medidas para evitar que os processos fossem modificados em grau de recursos no TJ-BA, os mantendo em sua unidade judicial.
Para julgar casos específicos, o juiz autorizava a distribuição de processos por dependência, através de despachos e, em outros casos, teria determinado que um servidor modificasse a classe processual sem redistribuir os autos. A esposa e a assessora do juiz, segundo os autos, detinham o token e a senha para a movimentação dos processos. Em muitos casos, o juiz apenas assinaria os despachos.
Em um desses processos, ele determinou o bloqueio de R$ 900 mil. Ele só determinou a redistribuição da ação após a realização de uma correição no local, com instalação de sindicância. De acordo com o corregedor, o juiz levantou vultosas quantias para beneficiar partes e advogados. Segundo o desembargador José Alfredo, os indícios são de violação de direitos das partes.
Um outro esquema que o juiz estaria envolvido consistia na atuação de um advogado, que enviava diversos pedidos parecidos na comarca de Paulo Afonso, para uma delas cair na 1ª Vara Cível, onde atuava Rosalino. Posteriormente, ele desistia de todas as demais ações distribuídas para outras varas. José Alfredo avaliou que tais demandas tinham um “endereço certo” e questionou: "Por que os advogados queriam que esses casos fossem julgados por esse juiz?”. Também observou que estranhamente esse processo tramitou de forma muito célere na unidade, sem obedecer ritos. Em apenas um dia, por exemplo, ele atendeu ao pedido da parte para bloquear R$ 1,8 milhão depositado em uma conta da Caixa Econômica Federal e expediu alvará para saque de R$ 900 mil. Para o corregedor, era claro que o juiz tinha um “comportamento tendencioso”.
Em outro fato relatado, o corregedor disse que ficou pasmo com o fato de Rosalino dos Santos ter expedido um alvará judicial para levantar valores referentes a um processo que tramitava na Justiça Federal. “O valor foi direcionado para a conta bancária de seu filho”, alertou José Alfredo. Também contou que o juiz fez “desaparecer” um processo do SAJ e que posteriormente apareceu no sistema PJE.
Outro fato que, segundo os desembargadores, demonstra uma atuação irregular do juiz foi ter atendido em apenas um dia a um pedido de uma parte, ter despachado e encaminhado ofício para o banco Santander bloquear valores de uma conta. Na mesma data, pediu a transferência dos valores bloqueados, destinando 34% para o advogado da causa e o restante para a autora da ação. Ainda causou mais estranheza entre os magistrados o fato do juiz ter trabalhado em processos durante as próprias férias, com expedição de alvarás para beneficiar uma parte de um processo. Em muitos casos, o juiz ignorava o devido processo legal. Para o corregedor, o fato do juiz estar aposentado não provoca a perda do objeto dos processos administrativos disciplinares. José Alfredo também negou o pedido de decretar sigilo nas ações contra o magistrado.
Em agosto de 2020, o TJ-BA abriu um processo administrativo disciplinar contra o juiz aposentado. Na época, a procuradora-geral de Justiça Adjunta, Wanda Valbiraci, pediu a remessa dos autos para o Ministério Público da Bahia (MP-BA) investigar a ocorrência de crimes. Desta forma, o órgão pode instaurar ações penais contra o magistrado (veja aqui).
SIGILO
O Tribunal de Justiça da Bahia ainda não analisou o pleito da Associação dos Magistrados da Bahia (Amab) para decretar sigilo ou segredo de Justiça nos processos envolvendo juízes (saiba mais). O pedido foi feito ao TJ-BA logo após a deflagração da Operação Faroeste, para evitar a exposição de magistrados publicamente e, assim, não macular a categoria. A solicitação foi embasada na Lei Orgânica da Magistratura (Loman). Na época, a presidente da entidade Nartir Weber declarou que a abertura do processo já é uma punição contra o magistrado. Apesar do tribunal ainda não ter definido a questão, muitos processos contra magistrados já tramitam numa espécie de sigilo, com publicações no Diário da Justiça Eletrônico (DJE) omitindo o nome dos processados, substituindo pela expressão “omissis”. Alguns processos ainda não estão públicos nos sistemas PJE e E-SAJ, mesmo após a abertura dos processos administrativos disciplinares.
FONTE: BN - 17/06/2021 11h:42min.
0 comentários:
Postar um comentário