sexta-feira, 9 de junho de 2017

"Trump ainda vive na idade da pedra " diz Arnold Schwarzenegger

foto:reprodução
Salvar o mundo nas telas já não basta para Arnold Schwarzenegger. Após implantar políticas ambientais na Califórnia, garantindo o título de “governador verde”, o ator, empresário e ativista mantém a luta contra as mudanças climáticas globais. À frente da organização The R20 – Regions of Climate Action, criada em 2010, ele tem usado suas habilidades e contatos no cinema para proteger o planeta. No recém-encerrado Festival de Cinema de Cannes, Schwarzenegger apresentou o documentário “Wonders of the Sea 3D”, que ele narrou e produziu para o diretor Jean-Michel Cousteau, filho do oceanógrafo Jacques Cousteau. Prestes a completar 70 anos, o ator defende a aplicação do Acordo de Paris (firmado em 2015, por 195 países), do qual os Estados Unidos se retiraram em 1° de junho. Nesta entrevista, o ator critica o governo Trump, nega retomar a carreira política e diz como modifica seus carros para poluir menos.
Como avalia a administração de Donald Trump, sobretudo a sua política ambiental, que destoa do legado de Barack Obama, incluindo o Acordo de Paris?
Desejo sorte a Trump como presidente. Se ele fizer um bom governo, todos nós ganharemos com isso. Tanto os republicanos quanto os democratas precisarão apoiá-lo no que ele estiver certo. No que diz respeito às mudanças climáticas, Trump está desinformado. Ele vive ainda na idade da pedra. Com o tempo, esperamos conseguir fazê-lo enxergar que os ambientalistas estão no caminho certo. Afinal, mais de sete milhões de pessoas morrem anualmente por causa da poluição. De qualquer forma, não é justo pensar que a causa ambientalista depende de uma só pessoa.

Como presidente dos Estados Unidos, as decisões de Trump têm impacto global…
Trump não é a única pessoa do mundo que não acredita na importância da defesa do meio ambiente. E também não será ele o homem capaz de parar o nosso movimento. Não devemos concentrar as nossas energias nisso. Prefiro acreditar no poder da população mundial. Prefiro agir. Se o documentário “Wonders of the Sea 3D” (Maravilhas do Mar 3D, em tradução livre) for visto por milhões de pessoas, espero que elas se encantem com as imagens e comecem a proteger o mar. Rodado nas águas de Fiji e nas Bahamas, o filme não só traz descobertas sobre o mundo marítimo como alerta para as ameaças que o oceano está sofrendo. O mar nos dá a comida e o ar que necessitamos.
Quando anunciou as suas ambições políticas, em 2003, candidatando-se como governador da Califórnia (cargo que ocupou até 2011), o senhor não foi levado muito a sério. De certa forma, o mesmo aconteceu com Trump, que acabou vencendo as eleições presidenciais.
Qualquer um que dispute uma eleição tem chance de ganhar. Não dá para saber, no mundo da política, para onde o vento vai nos levar. A última eleição presidencial nos EUA só confirmou que o povo está cansado de tudo o que vem acontecendo no país e no mundo. Foi por isso que os americanos resolveram entregar a nação não a um político, mas sim a um forasteiro.

Pensa em retomar sua carreira política?
Já disse várias vezes que, se eu tivesse nascido nos EUA, disputaria a eleição presidencial. E disputaria mesmo. Como não posso, por ser austríaco naturalizado norte-americano, prefiro impactar o mundo sem estar infiltrado na política. Há muitas outras maneiras de você defender as causas nas quais acredita, incluindo participando de associações filantrópicas. O ideal seria o setor público, o setor privado e as organizações sem fins lucrativos trabalharem juntos, para atacar o problema de ângulos diferentes.

O que faz a sua organização ambientalista, The R20?
Nós trabalhamos no sentido de encorajar as administrações dos estados, das cidades e dos bairros a cuidarem do problema elas mesmas. Não precisamos necessariamente esperar que as autoridades governantes de uma nação tomem as decisões. Acredito no poder das comunidades, adotando medidas localmente para combater as mudanças climáticas, combater a poluição, reduzir as emissões de gases de efeito estufa, abandonar os combustíveis fósseis e outras ações. A ideia é entregar o mundo em boas condições às gerações futuras. É uma obrigação que temos.

O senhor já disse que defender o meio ambiente não é muito diferente do trabalho que realizou para promover o fisiculturismo, em seu início de carreira.
E não é. Quando eu tentava difundir o fisiculturismo, há mais de 40 anos, muitos achavam que o esporte fazia mal ao coração (risos). Foi uma longa jornada para mudar essa imagem, acabando com o preconceito contra quem praticava, que era considerado esquisito. Mas deu certo. Hoje quase todo hotel, em qualquer parte do mundo, disponibiliza uma sala de ginástica. Quase todo mundo faz musculação, incluindo nas escolas e nos departamentos de polícia e de bombeiro. É bom lembrar que fazíamos a coisa do jeito certo: não apontávamos o dedo para os gordos. Mostrávamos apenas o que podia acontecer com o seu corpo, se você cuidasse dele. Da mesma maneira que celebrávamos o corpo humano, precisamos celebrar mais a natureza no sentido de levar adiante a mensagem ambientalista.

As entidades ambientalistas não têm feito isso?
Infelizmente, o movimento ambientalista tem o péssimo hábito de apontar o dedo, procurando culpados. Você está errado ao fumar, ao jogar lixo em lugar impróprio, ao acender a lareira, ao usar a banheira jacuzzi, ao viajar de avião e assim por diante. Mas não é assim que conquistaremos mais defensores do planeta. Não é possível progredir usando a culpa, que é uma força negativa. Ao celebrar a natureza em “Wonders of the Sea 3D” (ainda sem data para lançamento no Brasil), mostramos que a nossa filosofia é a de ver primeiro a metade do copo que está cheia e não a metade vazia.

Sempre foi tão otimista?
Sim. Sempre tentei ver o lado bom de tudo o que fiz. No início da minha carreira, muitos não entendiam como eu podia estar de bom humor acordando tão cedo para malhar pelo menos cinco horas por dia. Mas eu não via aquilo como uma tarefa árdua.

Como era sua rotina de treinos?
A cada série de exercícios de musculação que fazia na academia, eu me sentia feliz por me considerar mais perto das minhas realizações. Eu visualizava os meus objetivos, começando com a conquista do título do concurso de Mister Universo (que ele ganhou em 1967). O problema é não gostar do que se faz, um mal que atinge 74% da população americana, segundo pesquisas recentes. Sempre gostei do que fiz, mesmo quando tive de me arrastar pelo chão segurando uma espada, machucando os meus cotovelos e os meus joelhos nas pedras durante as filmagens de “Conan, o Bárbaro” (1982). Depois de várias tomadas, o diretor John Milius ainda virava para mim e pedia mais uma (risos).
Seria esse o segredo para não aparentar os seus 70 anos (que serão completados em julho)?
Provavelmente. Eu me exercito todos os dias e gosto do que faço. Trabalhar para mim é quase um hobby. Muitas vezes passo o meu tempo rodando filmes. Em outros dias, posso estar na África do Sul, na China ou na Austrália promovendo o evento Arnold Classics (a feira de fisiculturismo com a qual ele roda o mundo). Também posso estar em alguma universidade, fazendo discursos. Já aceitei oito doutorados honorários! Quando estou na Califórnia, posso estar fechando um negócio imobiliário para ganhar milhões de dólares ou simplesmente pilotando a minha motocicleta Harley Davidson de madrugada.
Como dar o exemplo na defesa pelo meio ambiente ao mesmo tempo em que circula com carros que emitem poluentes?
Meus Hummers (um tipo de caminhonete 4×4 conhecida por beber muito combustível) são movidos a hidrogênio, que não é poluente, ou biodiesel, que é menos poluente. A minha Mercedes-Benz Classe G350d acaba de ser transformada em veículo elétrico por uma empresa austríaca (a Kreisel). Outro Hummer que eu tenho será transformando em breve também, tornando-se o primeiro desses carros com motor elétrico. Como a tecnologia já está do nosso lado, não preciso me privar do prazer de dirigir. Costumo passar horas na estrada até Santa Barbara, só pelo prazer de tomar o café da manhã lá e depois voltar. Realmente não posso reclamar da vida que tenho.
Olhando para trás, quais fatores considera decisivos para ter chegado até aqui?
Desde criança, eu tinha uma visão muito clara do que faria da minha vida. Já sabia que eu me tornaria um campeão de fisiculturismo, que iria para os EUA, que faria filmes e que ganharia milhões de dólares. Só não imaginava que a minha carreira no cinema chegaria tão longe, a ponto de eu ter feito o filme mais rentável do ano de 1991, “O Exterminador do Futuro 2: O Julgamento Final” (com bilheteria mundial de mais de US$ 519 milhões).

A frase “I’ll be back” (Eu voltarei), da franquia de filmes “Exterminador do Futuro”, tem algum significado especial na sua vida?
Não necessariamente. O diretor James Cameron foi quem escreveu a frase. Eu me lembro de argumentar com ele por horas. Inicialmente eu queria a fala “I will be back”, sem abreviação, mas ele não deixou. James tinha razão, obviamente, já que ela se tornou uma das frases de filmes mais repetidas da história do cinema. Na maioria dos casos, as minhas falas ficam famosas por eu dizê-las de forma errada, pelo meu forte sotaque, fazendo as pessoas rirem. Não podemos nos esquecer do que Cameron disse na coletiva de imprensa do primeiro “Exterminador”. Segundo ele, o filme funcionou tão bem pelo fato de eu falar como uma máquina. Até hoje não sei se aquilo foi uma crítica ou um elogio (risos).
fonte:REVISTA ISTOÉ Elaine Guerini, de Cannes, França Edição 09.06.2017 - nº 2478/reprodução

0 comentários:

Postar um comentário