Acuado após ser alvo de mandados de busca e apreensão de celulares e computadores pela Polícia Federal em outubro de 2020, advogado carioca Nythalmar Dias Ferreira Filho(31) firmou há quatro meses um acordo de delação premiada com Procuradoria-Geral da República (PGR) denunciando ilegalidades cometidas pelo braço da Operação Lava-Jato no Rio de Janeiro.
De acordo com apuração da Veja, ele, que alegou ser vítima de perseguição, chegou a pedir uma audiência com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes no ano passado para tratar do tema, mas não obteve sucesso.
Documentos apresentados por Nythalmar, aos quais a revista teve acesso, revelam alguns segredos que o advogado pretende revelar às autoridades. O material aponta que o juiz Marcelo Bretas, responsável pelos processos da Lava-Jato no Rio, não é imparcial, e que o magistrado atua como policial, promotor e juiz ao mesmo tempo. Segundo os anexos apresentados pelo advogados, Bretas negocia penas, orienta advogados, investiga, combina estratégias com o Ministério Público (MP), direciona acordos, pressiona investigados, manobra processos e já tentou até influenciar eleições.
Dentre as provas das acusações está uma gravação de uma conversa ocorrida em 2017 entre Nythalmar, Marcelo Bretas e um procurador da República encarregado da operação. O trio discutia estratégias para convencer o empresário Fernando Cavendish, ex-proprietário da Construtora Delta, a confessar seus crimes em troca de vantagens judiciais. No áudio, o juiz diz a Nythalmar, que representava Cavendish, que havia sondado o MP sobre um acordo que a depender do resultado poderia “aliviar” a pena de seu cliente.
“Você pode falar que conversei com ele, com o Leo, que fizemos uma videoconferência lá, e o procurador me garantiu que aqui mantém o interesse, aqui não vai embarreirar”, diz Bretas, citando o procurador Leonardo Cardoso de Freitas, então coordenador da Lava-Jato no Rio, que também fazia parte da conversa. Bretas então acrescentou: “E aí deixa comigo também que eu vou aliviar. Não vou botar 43 anos no cara. Cara tá assustado com os 43 anos”. O tempo de pena é uma referência a outra decisão do juiz, conhecido pela rigidez de seus veredictos, que condenou o almirante Othon Luiz Pinheiro da Silva, ex-presidente da Eletronuclear, a 43 anos de reclusão, em 2016. “Foi boa então você ter colocado 43 no Othon, né?”, responde o advogado, sobre o temor gerado a outros investigados após a pena no início da Lava-Jato. “É, ooo”, confirmou o juiz.
A conversa rendeu frutos e após o empresário confessar ter pago milhões de propina a políticos, dentre outros crimes, assinou um acordo de delação premiada com o MP e conseguiu responder o processo em liberdade.
Agora em seu próprio acordo de colaboração, o advogado afirma que o áudio “demonstra de forma inequívoca que o juiz responsável, juntamente com os membros da força-tarefa, montou um esquema paraestatal, ilegal de investigação, acusação e condenação”. “O diálogo demonstra claramente que o juiz não só tinha ciência das colaborações antes de serem fechadas, bem como participava, negociava e intermediava com a ciência, participação e cooperação do MPF nas investigações, fato este gravíssimo”, acrescentou Nythalmar, expondo a suposta parcialidade de Marcelo Bretas, por se aliar a outras partes para negociar acordo.
O delator, que atuava na Vara comandada por Bretas desde 2016, revelou que tinha proximidade com o juiz e que a relação gerou rumores de tratamento privilegiado, sobretudo observada a rápida ascensão profissional. Na delação, ele detalha sua relação com o juiz e diz que de fã incondicional da Lava-Jato, se desencantou ao presenciar ilegalidades como pressões para que réus confessassem crimes em troca de penas mais brandas ou da sobrevivência de seus empreendimentos, no caso de empresários.
Um dos episódios mais escandalosos do comportamento impróprio de Marcelo Bretas apontado Nythalmar Ferreira foi a intermediação de um acordo informal com o ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, em troca de poupar a ex-primeira-dama Adriana Ancelmo das investigações de corrupção. O advogado conta que em maio de 2018, a pedido do filho de Cabral, procurou o juiz com a proposta de livrar Adriana. Segundo Ferreira, o magistrado ajustou detalhes com o procurador Eduardo El Hage, chefe da Lava-Jato no estado à época, e orientou que o casal redigisse uma carta de próprio punho “abrindo mão de todo o patrimônio”.
O advogado revelou ainda que para dissimular a jogada combinada entre as partes, o MP recorreu da decisão. Preso, Cabral passou a confessar seus crimes em junho de 2018 e em agosto do mesmo ano Bretas revogou a prisão domiciliar da ex-primeira dama e a autorizou a responder às acusações em liberdade.
Outra ilegalidade supostamente cometida por Marcelo Bretas apontada por Nythalmar Ferreira é a interferência nas eleições de 2018. Segundo o advogado, o juiz atuou deliberadamente para influenciar na disputa entre Wilson Witzel (PSC) e Eduardo Paes (PSD) ao governo do Rio de Janeiro.
O advogado conta que na véspera do primeiro turno Bretas vazou o depoimento de um ex-assessor de Paes, acusando o candidato que liderava as intenções de voto de envolvimento com fraude de licitações e recebimento de propina. Na delação, Nythalmar diz ter ouvido do próprio juiz a revelação de que tinha antipatia pelo ex-prefeito e que “foi importante que a população fluminense soubesse quem era Eduardo Paes antes da eleição”.
Ele conta ainda que para tentar selar a paz com o juiz, Pae se comprometeu a, caso eleito, nomear a irmã de Bretas para uma secretaria no governo. Ele diz ainda que na ocasião houve uma negociação incomum entre o magistrado, Paes e Witzel. Nythalmar relata que após ser derrotado, o ex-prefeito fez um acordo informal com Marcelo Bretas garantindo que abandonaria a política “em troca de não ser perseguido”. Witzel, por outro lado, nomeou Marcilene Cristina Bretas, a irmã do juiz, para um cargo na Controladoria-Geral do Estado.
fonte:BN - 04/06/2021 13h:10min.
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