Na quinta-feira passada, quando o país registrava a menor média móvel de mortes desde o início da pandemia, com 1.155 óbitos, o presidente Jair Bolsonaro recebeu das mãos da médica Maria Emília Gadelha Serra um documento de 15 páginas sobre "riscos" das vacinas. O material, ao qual O GLOBO teve acesso, foi produzido por um grupo de médicos liderados por Serra e classifica os imunizantes como "produtos experimentais injetáveis". Segundo a médica, o presidente disse que analisaria o conteúdo. O GLOBO apurou que o documento já está nas mãos de técnicos do Programa Nacional de Imunização (PNI) no Ministério da Saúde. A pasta, porém, nega que o tenha recebido oficialmente.
"Entreguei ao presidente documento sobre os imunizantes e os riscos extremamente preocupantes da aplicação desses 'produtos experimentais' em grávidas, lactantes e crianças. Bolsonaro tomou conhecimento e disse que iria analisar", afirmou Serra, por mensagem.
O material, informa a médica, que postou foto no Instagram com o presidente, inclui dados extraídos do VigiMed (sistema eletrônico para a notificação de eventos adversos relacionados ao uso de medicamentos e vacinas). Graduada pela UFRJ, mestre em Otorrinolaringologia e Cirurgia de Cabeça e Pescoço pela Unifesp, Maria Emília Serra também é presidente da Sociedade Brasileira de Ozonioterapia Médica (SOBOM).
De acordo com especialistas, a aceleração da vacinação no país é a causa central da redução no número de óbitos por Covid-19. A imunização em massa é reconhecida pelo Ministério da Saúde como a principal estratégia para conter a pandemia no país. Apesar disso, são frequentes as declarações do presidente questionando a eficácia dos imunizantes. Bolsonaro destoa dos líderes mundiais ao escolher não se vacinar.
Ao longo de cerca de 15 páginas, o documento entregue ao presidente fala sobre "reações indesejadas" das vacinas e se posiciona contrariamente a um projeto que tramita no Congresso para instituir uma espécie de "passaporte da imunidade" com o objetivo de abrandar restrições a pessoas vacinadas, permitindo o acesso a eventos culturais e esportivos, por exemplo.
A última versão do documento apresentado a Bolsonaro é assinada por 241 médicos. Para se ter uma ideia, o Conselho Federal de Medicina (CFM) conta com 567.930 profissionais registrados.
Além da rejeição ao "passaporte da imunidade", os 241 médicos defendem que seja assinado um termo de consentimento por aqueles que forem se vacinar, com informações das bulas das vacinas, "uma vez que tais informações não estão sendo amplamente divulgadas ao público".
Os médicos pedem ainda notificação obrigatória dos efeitos adversos relacionados a vacinas; autópsia de pessoas que morrerem e tenham sido vacinadas; e auditoria de, no mínimo, três amostras de cada uma das vacinas aprovadas no país, por "laboratórios independentes". Os médicos listam dez laboratórios "sem conflitos de interesse com as indústrias farmacêuticas produtoras das mesmas e sem vínculos políticos".
"Gostaríamos de deixar claro que este ofício não é uma cruzada contra vacinações em geral, mas a necessária exposição de aspectos específicos, preocupantes e graves sobre as atuais ditas vacinas contra a Covid-19 que foram autorizadas em tempo recorde com tecnologias nunca antes utilizadas em massa em seres humanos e de composição, benefícios e riscos que não foram e continuam não sendo transparentes para a sociedade", diz o documento.
Ao longo do texto, no entanto, os pesquisadores levantam dúvida sobre a eficácia e a segurança dos imunizantes contra a Covid-19, argumentando que a "pressa" com que as vacinas teriam sido desenvolvidas é incompatível com "biossegurança".
Atualmente, quatro vacinas são utilizadas pelo PNI para imunizar a população brasileira (Pfizer, Janssen, CoronaVac e Oxford/AstraZeneca) e todas elas passaram pelo crivo da agência antes de serem disponibilizadas à população. A ampla análise da Anvisa considerou não só informações sobre eficácia, mas também sobre a segurança dos imunizantes. Apesar disso, além de entregar os documentos contrários à vacina da Covid-19 ao presidente, os médicos enviaram o conteúdo ao Poder Judiciário e ao Ministério Público.
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