segunda-feira, 7 de novembro de 2022

Salvador: Justiça afasta procurador denunciado por assédio moral na Câmara

 

                                            foto:reprodução

A juíza substituta Viviane Christine Martins Ferreira, da 3ª Vara do Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região, determinou, na tarde desta segunda-feira (7), o afastamento imediato de Marcos Vinicius Leal Gonçalves da Procuradoria Jurídica da Câmara Municipal de Salvador. Chefe do setor, Leal é acusado formalmente de assédio moral por quatros advogadas. Desde junho, o Ministério Público do Trabalho (MPT) pedia o afastamento dele das atividades.

Na decisão, que acata o pedido do MPT, a juíza  entende que o afastamento imediato e preventivo de Leal é uma “medida acautelatória”, já que ele é “o principal autor dos atos de assédio moral apurados na investigação do MPT”. Ela ainda determina que a Câmara apure eventuais denúncias de assédio moral, discriminação ou abuso de poder, e promova, durante dois anos, cursos e palestras periódicas sobre assédio moral no trabalho.

“Essa decisão nos devolve a dignidade e o respeito pelo qual lutamos arduamente durante todo esse tempo de sofrimento que amargamos na Câmara. Sabemos que ela representa uma vitória que não é só nossa, é de todas as mulheres”, afirmaram as denunciantes, em anonimato, à reportagem, depois da decisão judicial.

Caso o procurador não seja afastado, “com urgência”, segundo a decisão, a Câmara deverá pagar multa de R$ 30 mil. Ele ocupa cargo comissionado na função desde janeiro 2019. Primeiro, ocupou cargo de subprocurador. Dez meses depois, em novembro, foi promovido a procurador chefe. 

Em julho, o CORREIO publicou reportagem sobre o assédio moral alegado por quatros advogadas. Durante mais de um ano, elas recolheram provas materiais para denunciar por assédio moral o chefe da Procuradoria Jurídica da Câmara.

Elas decidiram denunciar o chefe em janeiro de 2021, mas só formalizaram a queixa ao MPT no fim de março deste ano, depois de registrarem momentos que fundamentassem a denúncia, como gravações de reuniões e conversas particulares com o chefe.

No dia 10 de junho, chegou à Câmara um despacho da procuradora do Trabalho Rosineide Mendonça Moura. Ela recomendava o afastamento de Leal até 10 de julho, por entender  que as denúncias eram “graves” e ofendiam  “o princípio da dignidade da pessoa humana e os valores sociais do trabalho”. Mas a recomendação não foi cumprida. 

Em uma conversa anexada à queixa feita ao MPT, Leal discute com uma servidora sobre o andamento de um processo. A servidora tenta mostrar discordâncias quanto ao posicionamento do chefe. Ele responde: “Você tem de cumprir ordens, você exerce função, se você não quiser, você bate um memorando e renuncia e eu nomeio outra pessoa”. De acordo com as denúncias, coerções como essa se tornaram comuns no ambiente de trabalho.

A reportagem tentou contato com a CMS, mas não foi atendida até o fechamento da publicação. O espaço segue aberto.

Confira a decisão na íntegra:

Outros casos

Servidores da Câmara se encontraram em reunião, no dia 12 de julho, para discutir as ocorrências de assédio mora. Ao menos 30 pessoas participaram do encontro e relataram outros episódios em que se sentiram abusadas.

Uma das participantes chegou a prestar queixa na Delegacia do Idoso. A reunião, realizada em formato online, foi agendada depois que reportagem do CORREIO tornou público o caso das quatro advogadas. Ele nega as acusações.

“Não há nada que desabone minha conduta. Todos sabem que minha conduta é muito correta. Eu, na qualidade de chefe, tenho que zelar pelo órgão e isso faço com muita propriedade. [...] Como alguém recomenda [meu afastamento] sem ninguém me ouvir?”, afirmou o procurador ao CORREIO naquela ocasião.

Na reunião, funcionários contratados ou concursados públicos da CMS discutiram o que o presidente da Associação de Servidores da Câmara (Ascam), Sidelmar Castro, chamou de “assédio generalizado” na casa. Ficou decidido no encontro que haverá ingresso de novas ações no Ministério Público do Estado da Bahia (MPE-BA), Ministério Público do Trabalho (MPT) e Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Bahia (OAB-BA), relacionadas ao caso. 

Outros relatos

Duas servidoras da Câmara falaram, na reunião promovida em julho, de episódio de assédio vividos por elas. Uma contou que o procurador jurídico Marcus Vinícius Leal Gonçalves foi desrespeitoso.

“Ele meteu o dedo na minha cara e disse: ‘você procure me respeitar porque eu posso mandar você para a rua’. Eu respondi: quem vai para a rua é você que não é concursado”, relatou a servidora.

A situação, ainda segundo ela, teria ocorrido depois de uma brincadeira da servidora com duas colegas. O caso rendeu o registro de um boletim de ocorrência na Delegacia do Idoso. 

Outra funcionária, atualmente de licença, relatou que ela e quatro colegas foram ‘agredidos moralmente pelo procurador’. “Uma colega saiu chorando da Projur”, acrescentou. 

Das advogadas que denunciaram o procurador ao MPT, em janeiro de 2021, uma participou daquela reunião online.  “A gente não tem filiação política e não vamos aceitar tudo que estamos passando, a gente deitou no chão para sermos pisadas e não vamos admitir que tudo isso que a gente fez [as denúncias contra Leal] seja jogado no lixo e dado conotação política. Quem tem telhado de vidro não faz o que a gente fez”, argumentou a advogada, ao falar sobre as denúncias.

Procurador sempre negou acusações

Em todas as ocasiões em que foi procurado, Marcus Vinicius Leal negou conhecer as acusações que pesavam contra ele. Mas disse nunca ter sido abusivo.

“Elas estão exercendo o direito delas, eu respeito o exercício do direito. Discordo porque entendo que não existe presente qualquer situação de assédio, mas apenas um inconformismo da parte delas em relação ao meu comportamento como chefe. Sem qualquer assédio, humilhação e constrangimento, porque eu sou altamente respeitoso e correto", falou em julho.

No decorrer da entrevista concedida, por telefone, depois da segunda reunião online, o procurador afirmou que as discordâncias profissionais são ‘meras divergências’. “Se existe servidor que não concorda com os meus posicionamentos, é uma mera divergência da vida”, afirmou.

“Não existe briga por conta dessas divergências. Agora, o que eu tenho com os servidores antigos, que foram os que participaram da reunião da Ascam, é uma divergência de natureza jurídica. Eu, na condição de chefe da procuradoria dou um parecer de acordo com a minha convicção e eles não aceitam. É apenas isso. Como eles não concordam, partem para o ataque e para a acusação de que eu estou perseguindo. Ter o entendimento diferente de outra pessoa não é perseguição. É pensar diferente".

Fonte: Correio da Bahia - 07/11/2022

 

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