A grande reviravolta no governo brasileiro, com o anúncio da mudança de seis ministros em um único dia, tem repercussão na imprensa internacional nesta terça-feira (30). O jornal francês Le Monde afirma no título de sua matéria que “Jair Bolsonaro surpreende ao reformar seu governo, destacando que, das seis mudanças de ministros, apenas a saída do chefe da diplomacia brasileira, Ernesto Araújo, era esperada”. E chama de “fiasco” sua atuação na política contra o coronavírus, que já matou cerca de 314 mil pessoas no Brasil.
O correspondente do Le Monde no Rio de Janeiro, Bruno Meyerfeld, diz que a saída de Araújo do Itamaraty tornou-se inevitável com a chegada de Joe Biben à presidência dos Estados Unidos. "O ex-chanceler, um trumpista de coração, antichinês, adepto de teorias da conspiração e negacionista, representava a ala mais obscurantista do poder bolsonarista", assinala.
Na noite de segunda-feira (29), os especialistas questionavam o significado a ser dado a essa "varredura" inesperada, prossegue o correspondente. Depois de explicar que a reforma teve o objetivo de facilitar a articulação com o centrão, o jornal francês destaca que a mudança mais importante ocorre na Defesa.
“Ao demitir o ministro da Defesa [Fernando Azevedo e Silva], Bolsonaro quis enviar um sinal ao comandante do Exército, Edson Pujol, e aos militares moderados, que resistem a seus impulsos autoritários”, analisa Mathias Alencastro para o Le Monde. "O tiro de advertência foi recebido pelos oficiais superiores, surpresos e furiosos", relata o correspondente, contando que "Pujol convocou uma reunião de cúpula de altos oficiais militares brasileiros, dando a entender à imprensa que uma renúncia coletiva estava sobre a mesa". "Entre os generais e o capitão, a guerra parece declarada", observa a reportagem.
O jornal Le Figaro também destaca a atuação vergonhosa de Ernesto Araújo à frente da diplomacia brasileira, acrescentando que as mudanças anunciadas ontem também trazem um novo chefe à Casa Civil e uma terceira mulher ao governo, de um total de 22 ministros, a deputada Flávia Arruda, que assume a Secretaria da Presidência.
Para o diário espanhol El País, a saída dos ministros das Relações Exteriores e da Defesa abre a maior crise do governo Bolsonaro em meio à pandemia. Araújo é apontado como o maior responsável pelo fato de o país não ter conseguido comprar na China e em outros mercados uma quantidade suficiente de imunizantes para uma vacinação em massa que permita uma certa recuperação econômica. A publicação atribui o afastamento do general Fernando Azevedo, entre outros motivos, às declarações de um subordinado à imprensa sobre os benefícios do isolamento social, o uso de máscara e a previsão de uma terceira onda da epidemia.
El País afirma que a gestão da pandemia começa a afetar a política de Bolsonaro, que ainda mantém o apoio de um terço do eleitorado brasileiro. E que o retorno de Lula à cena, após ter sido reabilitado politicamente com a anulação das sentenças, também contribuiu para acelerar o questionamento do atual governo, que alimenta a crescente insatisfação das elites econômicas.
Já o jornal italiano La Repubblica lembra a insatisfação dos governadores de 16 dos 27 estados brasileiros, que recentemente expressaram por carta sua "indignação" com a crescente "onda de agressões" e incitamento à violência, "por meio da divulgação sistemática de notícias falsas destinadas a criar instabilidade institucional no país".
FONTE: RFI - 30/03/2021 10h:31min.
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