sábado, 23 de junho de 2012

Bahia:Estudo mostra que um terço dos baianos recebe Bolsa Família



Mais de 1,4 milhão de baianos vive na extrema pobreza e 76% ganha menos de um salário mínimo. A situação faz com que um terço da população do estado receba Bolsa Família. Gráfico: Editoria de arte/correiodaBahia

Almerinda dos Santos tem 61 anos. Todos os dias, deixa sua casa em busca de comida para os seis netos que cria e, se der, para ela própria. Desce 18 degraus, cruza uma viela e sobe mais 90 degraus até o largo da Escola Teodoro Sampaio, em Santa Cruz. A quantidade de degraus é o menor dos problemas de Almerinda. Para comprar comida, ela só conta com R$ 38. Não é para o dia. É para o mês inteiro.Somos 1,4 milhão de baianos extremamente pobres. Famílias que vivem com menos de R$ 67 (por pessoa) por mês. Como dona Almerinda. Os dados inéditos foram divulgados esta semana pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e fazem parte do estudo Perfil da Pobreza na Bahia e sua Evolução no Período 2004-2009.Nos cinco anos, a Bahia avançou. O percentual de extremamente pobres caiu de 16% para 10%. A melhoria, porém, não tira do estado a liderança em números absolutos de pobreza extrema - com quase 500 mil pessoas a mais do que o segundo colocado – Pernambuco (926 mil).O coordenador de Informações do IBGE na Bahia, Joilson Rodrigues, diz que a redução no percentual da pobreza tem duas razões: a valorização do salário mínimo e a transferência de renda por programas sociais, como o Bolsa Família - que hoje atende mais de um terço da população baiana.No total, são 5,4 milhões de baianos recebendo o auxílio. “É um número alto, mas necessário já que o Bolsa Família ainda não atende a todos os baianos em situação de pobreza”, acrescenta Pedro Souza, pesquisador do Ipea e um dos autores do estudo. No Brasil, 22% da população é atendida pelo programa.



Luta



Dona Almerinda vive do Bolsa Família. “Já vi a cara da fome, meu filho. E não foi pouco, não. Se tem comida, a gente come. Se não tem, a gente reza e espera Deus mandar”, diz a idosa, sem perder a firmeza da voz. Em casa, 1 kg de feijão, 1kg de arroz e 1kg de carne são consumidos em um dia. No mercadinho mais próximo da casa de dona Almerinda, na Rua 11 de Novembro, o quilo do feijão custa R$ 4,49. O do arroz, R$ 1,69. A Cruz Machado - “que é a carne que a gente bota quando dá”, sai por R$ 11,20. Ou seja, para a família fazer uma refeição, gasta-se R$ 17,38, quase metade do que se tem para 30 dias. A ex-catadora de material reciclável se vira como consegue. Na igreja que frequenta, a Assembleia de Deus, recebe doações esporádicas. Uma das filhas, a líder comunitária Leozana Santos, também ajuda quando sobra alguma coisa do salário mínimo que recebe como servente da Câmara Municipal. “Quando não tem de onde tirar, peço aos vizinhos”, conta Almerinda.Dos seis netos que moram com ela, cinco ficaram sob sua responsabilidade há três anos, quando a mãe das crianças foi morta pelo próprio marido. Foi aí que ela teve que largar o trabalho de catadora, de onde tirava R$ 60 por mês.



Educação



Jeane tem 18 anos, Igor, 16, Iago, 14, Iran, 13, Gabriel, 8, e Maria Eduarda, 6. Almerinda é analfabeta, mas não deixa os netos longe da escola. “Faço de tudo pra ocupar esses meninos. É aula, capoeira, artesanato, qualquer coisa pra não deixar eles aí com a cara pra cima”. Sábia decisão. A pesquisa do Ipea mostra que a população não pobre tem, em média, três vezes mais tempo de escolaridade que a extremamente pobre - 9 contra 2,9 anos.“Já passei muita privação. Só desejo que meus netos consigam o que não consegui. Estou fazendo o impossível pra isso”, resume Almerinda. Envergonhados, os dois caçulas dizem que serão médicos - para dar a avó o que ela quiser.Ontem, a família comeu arroz, feijão e carne. Ontem, Almerinda não sabia se teria o que comer hoje. Iguarias de São João? “Já falei pros meninos que não vai ter. Se algum dia der, compro milho e laranja e a gente come”, conclui.



Solução nacional passa pela Bahia, diz autor do estudo



Os números da pobreza e da extensão do Bolsa Família na Bahia revelados pelo estudo do Ipea são realmente representativos na opinião do pesquisador do Ipea Pedro Souza, um dos autores do estudo. “A resolução da pobreza extrema no Brasil tem que passar pela Bahia. Se o problema for resolvido no estado, é possível resolver em outros locais”, diz.De acordo com a pesquisa, 76% dos baianos recebem menos de um salário mínimo (10% são extremamente pobres, 17% pobres e 49% vulneráveis). A principal justificativa, segundo Souza, é a extensão do estado. Outro motivo é a desigualdade regional que atinge a região Nordeste. Com relação ao Bolsa Família - que atende a um terço da população - Souza lembra que o programa não resolverá o problema do estado. A própria pesquisa do Ipea diz que o Bolsa Família é um “instrumento de alívio”, mas não é capaz de retirar as pessoas desta situação de extrema pobreza, já que a transferência média é de R$ 100 por família e são necessários R$ 67 por pessoa para deixar este quadro. Há um segmento da população especialmente atingido pela pobreza: as crianças. Segundo o estudo, 42% dos baianos entre 0 e 14 anos são pobres ou extremamente pobres. Apenas 11% estão entre os ‘não pobres’. “Temos poucas políticas voltadas para as crianças. Mas o Brasil Carinhoso pode melhorar este quadro”, comenta Souza.O novo programa do governo federal vai transferir renda para famílias com crianças de 0 a 6 anos. Em contrapartida, Souza destaca que o estereótipo de que as famílias mais pobres têm muitas crianças está mudando. Se em 2004, as famílias extremamente pobres tinham uma média de 2,4 filhos, em 2009 o número caiu para 1,9 filho. “Domicílios com mais de quatro crianças são cada vez mais raros”, finaliza o pesquisador Pedro Souza.



Zona rural é desafio



Um dos grandes desafios para reduzir a pobreza extrema na Bahia é o campo. Na área urbana, o estado conseguiu reduzir pela metade o número de 1,1 milhão de baianos extremamente pobres entre 2004 e 2009 - em termos percentuais caiu de 12% para 6%.Já no campo, essa queda chegou a nove pontos percentuais, mas ainda está em 17%. “São famílias com condições precárias de acesso ao mercado de trabalho, ou produtores de subsistência (plantam para comer), com pouco acesso à terra, ou ao crédito”, explica o pesquisador do Ipea e um dos autores do estudo, Pedro Souza, fazendo em seguida um comparativo: em São Paulo e no Rio de Janeiro, este percentual não chega a 10% e, no país, cerca de 20% vivem em áreas rurais.Segundo a coordenadora estadual do Bolsa Família na Bahia, Luciana Santos, da Secretaria de Desenvolvimento Social e Combate à Pobreza (Sedes), programas para atender aos agricultores rurais têm sido desenvolvidos pelo governo do estado, como o Viver Melhor, além do programa que implanta cisternas para facilitar o acesso à água. “A meta deste ano é instalar 22 mil cisternas e atender a 600 mil agricultores familiares”, diz Luciana. A coordenadora, porém, não soube estimar quantas cisternas foram instaladas nem quantos agricultores foram atendidos.




Fonte:CorreiodaBahia/reprodução

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