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quarta-feira, 20 de novembro de 2024

SP: Mulher que acompanhava estudante morto por PM diz que ele a agrediu


  

                                            Imagem: Obtida pelo UOL

Confira a reportagem de  Valmir Salaro, Pedro Vilas Boas e Luccas Lucena do site UOL de hoje (20) no link abaixo:

https://noticias.uol.com.br/cotidiano/ultimas-noticias/2024/11/20/mulher-que-acompanhava-estudante-morto-por-pm-em-sp-diz-que-ele-a-agrediu.htm

Na Bolívia: Brasileiros relatam assédio e extorsões em curso de medicina; aluno que se matou era natural de Rui Barbosa na Bahia

                                                 foto: imagem cedida ao UOL

As denúncias de assédios e extorsões praticadas por professores Bolivianos com alunos brasileiros que estudam medicina na Bolívia, não são novas, mas o suicídio de um estudante natural da cidade de Rui Barbosa, região da Chapada Diamantina na Bahia, reacendeu esse grave problema enfrentado pelos brasileiros, que desencadeou protestos em frente as instituições de ensino. 

O estudante baiano Sebastião Peixoto Júnior, de 46 anos, fez um desabafo em sua conta no facebook, no dia 03/11/2024, dias antes de cometer suicídio, deixando esposa e dois filhos. Confira aqui: http://jorgeluizfiqueinformado.blogspot.com/2024/11/bolivia-estudante-baiano-de-medicina-e.html

                                           

                                                   Uol/Youtube -acesso em 20/11/2024


Confira a reportagem de Patrícia Calderon  para o site  UOL de hoje (20)no link abaixo:

https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noticias/2024/11/20/brasileiros-relatam-assedio-em-curso-de-medicina-na-bolivia-aluno-morreu.htm


Fonte:UOL c/adaptações

Brasil: O que disse a imprensa internacional sobre esquema para matar Lula, Alckmin e o ministro do STF

 Alexandre de Moraes e Lula

O presidente eleito e Lula e o presidente do TSE Alexandre de Moraes en dez/22 na diplomação. foto:Getty Imagens/reprodução

O New York Times destacou em sua reportagem que os detidos "tinham um 'alto nível de conhecimento técnico militar' para organizar um complô".

O jornal americano conversou com o advogado do ex-presidente Jair Bolsonaro, Paulo Cunha Bueno, que disse que seu cliente não teve envolvimento ou conhecimento do complô.

Segundo depoimento do advogado de Bolsonaro ao New York Times, o ex-presidente "nunca concordou ou participou de qualquer tipo de plano dessa natureza".

O New York Times afirmou que "as prisões fazem parte de uma investigação mais ampla sobre uma tentativa de golpe e o papel de Bolsonaro na tentativa de manter o poder após a última eleição presidencial do Brasil, quando ele foi derrotado por pouco por Lula".

"Como parte desta investigação, Bolsonaro foi acusado de planejar prender um juiz do Supremo Tribunal, editar pessoalmente um projeto de decreto com o objetivo de anular os resultados das eleições e apresentar planos de golpe aos principais líderes militares, buscando seu apoio, de acordo com declarações policiais."

"Bolsonaro negou diversas vezes ter cometido qualquer irregularidade, chamando a investigação de perseguição política."

O Financial Times, jornal financeiro de Londres, destacou que "as prisões marcam uma novidade significativa nas investigações em andamento sobre supostas tentativas de reverter ilegalmente a eleição de Lula".

O jornal fala que os conspiradores "aprovaram a intriga em uma reunião na casa do companheiro de chapa derrotado de Bolsonaro, o general aposentado e ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto, disse o documento da Suprema Corte".

"O grupo supostamente planejava instituir um 'gabinete de crise' após o golpe, liderado por um general aposentado do exército e Braga Netto. Ele não respondeu a um pedido de comentário."

O Financial Times disse que "no final, nenhum golpe ocorreu na nação mais populosa da América Latina".

"Mas dias após a posse de Lula no ano passado, milhares de apoiadores radicais de Bolsonaro saquearam prédios do governo em Brasília em 8 de janeiro de 2023, pedindo intervenção militar para anular o resultado da eleição, que eles alegaram sem evidências ter sido fraudada", afirma o jornal.

O também britânico The Guardian afirmou que "as últimas revelações representam as mais sérias que vieram à tona até agora durante a investigação sobre as tentativas de golpe orquestradas por apoiadores de Bolsonaro após os resultados das eleições de 2022".

"Outras incluem a violência em Brasília durante a certificação de Lula em 12 de dezembro de 2022, a descoberta de um dispositivo explosivo preso a um caminhão de combustível perto do aeroporto da capital em 24 de dezembro de 2022 e os tumultos em 8 de janeiro do ano passado", afirma o Guardian.

O jornal britânico destacou que "a falta de apoio total entre os membros do alto comando do Exército" seria a "possível razão pela qual o plano não foi efetivamente executado".

A rede Al Jazeera destacou que "esta foi a primeira vez na investigação da suposta tentativa de golpe que a Polícia Federal mencionou um complô para matar Lula e o vice-presidente Geraldo Alckmin."

"A polícia disse que os suspeitos sob investigação planejaram a instalação de um 'Gabinete de Gestão de Crise Institucional' para administrar os problemas decorrentes do golpe", afirma a Al Jazeera.

A rede americana CNN noticiou que "de acordo com um mandado policial cumprido na terça-feira, Bolsonaro teria se encontrado com autoridades do Exército e da Marinha, bem como com o ministro da Defesa, em dezembro de 2022, para apresentar um documento detalhando o arcabouço legal que o manteria no poder".

"O ex-presidente negou repetidamente as alegações de tentativa de golpe."

Fonte: BBC NEWS - 20/11/2024 - 13h:50

SP: 'Quer dialogar sobre o racismo? Leia uma mulher negra', diz escritora baiana Luciany Aparecida

Luciany Aparecida sentada e sorrindo em evento

CRÉDITO,DIVULGAÇÃO/HILDERMAR TERCEIRO

Legenda da foto,'Ser negra no Brasil é um lugar de incômodo', diz a escritora Luciany Aparecida


Quando Luciany Aparecida tinha cerca de 12 anos, uma vizinha a levou para relaxar os cabelos. No dia seguinte, quando ela apareceu na escola no interior da Bahia com o cabelo alisado, “foi um susto”. Colegas disseram que nem sabiam que ela tinha cabelo.

“É a sociedade que diz que sou uma mulher negra. Foi o mundo que primeiro disse que sou negra. Foi a escola, do jeito mais perverso possível”, conta Aparecida à BBC News Brasil.

A escritora nasceu na zona rural do Charco, no Vale do Jiquiriçá (BA).

“Ser negra no Brasil é um lugar de incômodo”, afirma.

Na noite desta terça-feira (19/11), foi anunciado que o prêmio na categoria foi vencido por Itamar Vieira Junior com seu livro Salvar o Fogo.

A BBC News Brasil conversou com Luciany Aparecida antes do anúncio dos vencedores do Jabuti, durante a Festa Literária das Periferias (FLUP), no Rio de Janeiro, onde 90% das convidadas eram mulheres negras.

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Mata Doce é o primeiro livro que Aparecida – que também é doutora em Letras e professora da PUC de São Paulo – assinou com seu nome verdadeiro.

Nesta entrevista, ela conta ter escrito livros em segredo por muitos anos antes de tomar coragem de se afirmar escritora. E diz que escrever é “acionar um lugar de existência” em um país racista e patriarcal como o Brasil.

“Quando eu escrevo, em alguma medida, estou criando um mundo possível para o meu corpo viver no Brasil, o que nem sempre é possível”, afirma Aparecida.

“Você quer dialogar com a sociedade sobre o racismo? Leia uma mulher negra”, indica. “Esse é o melhor diálogo que podemos fazer.”

Leia abaixo a entrevista completa.

BBC News Brasil - Você cresceu em uma zona rural humilde na Bahia e conseguiu se formar em Letras, ser doutora, escritora e agora obter esse reconhecimento. Está mais fácil, no Brasil de hoje, dar um salto tão grande?

Luciany Aparecida - Não sei se está mais fácil. Mulheres como eu sempre transitamos por lugares pelos quais não se imaginava que pudéssemos transitar no Brasil. Temos uma tradição de mulheres que acionam lugares de deslocamento social, intelectual e cultural.

Venho de uma tradição na qual a intelectualidade não está associada a uma carreira acadêmica ou classe social. Conheço grandes intelectuais que são de uma classe pobre. E isso não está na tradição hegemônica de como a sociedade está organizada, ou no pensamento eurocêntrico que as universidades vendem.

Minha literatura dialoga muito com a história do Brasil. Na história, temos mulheres que foram arrastadas para o Brasil pelo sequestro, aqui vivendo no sistema escravista, e isso não as impediu de acionar lugares de liberdade, o que era um salto absurdo de vida. As mulheres negras de minha família fizeram deslocamentos assim.

Ao mesmo tempo, sim, no Brasil isso é mais visível nos últimos dez anos. As cotas nas universidades alteram a intelectualidade nesse contexto. A chegada de professoras negras nas universidades abre o referencial bibliográfico das disciplinas, e vemos mais escritoras negras nas bibliografias.

Isso forma um público leitor que força editoras a ter livros de mulheres negras. Isso faz com que a carreira literária de uma mulher como eu tenha possibilidade de disputa nas cenas literárias mais hegemônicas, porque existe um público leitor, porque há uma crítica com disposição de ler o texto, fazer entrevistas, conversar, tudo vai casando.

BBC News Brasil - Essas intelectuais que você menciona são da sua família?

Aparecida - Sim. Minha avó materna foi contratada como professora para ensinar uma família branca a ler no começo do século 20. Ela era de uma classe pobre e acionou um lugar de intelectualidade – a leitura e a escrita – e foi contratada como professora.

Minha avó materna é uma mulher negra de pele retinta, que teve acesso ao ensino formal no começo do século 20 porque sua madrinha, uma mulher branca que não teve filhos, financiou seu estudo formal. A partir disso, ela se tornou professora.

Essa ainda é uma história do escravismo no Brasil, porque esse deslocamento intelectual não quis dizer (mudança de) classe. Minha avó fez um deslocamento intelectual, mas não passou a ser uma mulher rica. Essas questões são complexas. Mas o que quero dizer é que tive a quem puxar (risos).

Aparecida gesticulando e sorrindo enquanto fala em evento, sentada

CRÉDITO,DIVULGAÇÃO/HILDERMAR TERCEIRO

Legenda da foto,Antes de publicar Mata Doce, Aparecida usava pseudônimos

BBC News Brasil - Você ganhou o Prêmio São Paulo ao lado de Eliane Marques. Foi simbólico que duas mulheres negras tenham ganhado esse prêmio tão importante. Isso fala da importância da cena de escritoras negras, desse espaço que está se abrindo no Brasil?

Aparecida - Eu queria muito dizer que sim. Mas no Brasil existem muitas mulheres negras como eu e a Eliane escrevendo literatura há muito tempo. Estamos em um bom momento, mas isso de nenhum modo quer dizer que não existiram mulheres antes da gente. Se estamos ocupando esse lugar, é unicamente porque muitas mulheres estão escrevendo há muito tempo.

E essas mulheres criaram público leitor para a nossa literatura no Brasil. Se hoje chegamos a esses prêmios, é porque existe um público leitor.

Não era para ser extraordinário nós duas ganharmos um prêmio. Era para ser cotidiano. Mas se a gente para para pensar, qual foi a última mulher negra que ganhou na categoria romance um prêmio literário de destaque no Brasil? Qual mulher baiana ganhou um prêmio de destaque assim?

Temos marcos como Um Defeito de Cor (Ana Maria Gonçalves), Ponciá Vicêncio (Conceição Evaristo), O Crime do Cais do Valongo (Eliana Alves Cruz), três romances que fundaram uma geração de mulheres romancistas no Brasil, mesmo sendo completamente diferentes entre si. Isso gera um desejo de escrita, uma inspiração. Esses textos nos humanizam.

No Prêmio São Paulo de Literatura, Lília Guerra estava na mesma categoria que eu com o romance O Céu para os Bastardos. Esse livro me humanizou. Fui felicíssima para a cerimônia pensando que poderia dizer isso para ela. Ao ler o livro, eu pensei, “a história de minha vida no meu país tem validade”. Isso me dá uma segurança absurda de existir. Isso me diz, está tudo bem, você pode viver.

BBC News Brasil - Qual é a temática do livro, o que te tocou?

Aparecida - Ele fala dessa possibilidade de deslocamento na sociedade e dos lugares de existência das mulheres. Livros como o Céu para os bastardos e Louças de família (Eliane Marques) trazem personagens femininas negras complexas, que ocupam lugares de exaustão na sociedade, mas ao mesmo tempo de reflexão existencial profunda.

Então você pensa, ok, eu vivo situações de violência e de exaustão, mas eu também posso dialogar intelectualmente sobre isso no mundo.

Quando lemos esse livro, ganhamos dignidade. E eu penso assim, eu posso ser escritora, eu posso continuar fazendo o que estou fazendo. Isso é fundamental para complexificar o mundo, independente da pessoa leitora ser branca ou negra. Todo mundo ganha, todo mundo sai com uma maior percepção.

BBC News Brasil - Como foi a sensação de receber o prêmio?

Aparecida - Estou felicíssima com o prêmio e com a possibilidade de que as pessoas leiam Mata Doce. Eu acho que essa é a maior dignidade. O maior prêmio que uma escritora viva pode receber é que as pessoas leiam o seu livro.

Então quero só dizer para todas as pessoas – você quer dialogar com a sociedade sobre o racismo? Leia uma mulher negra. Esse é o melhor diálogo que podemos fazer.

BBC News Brasil - A Flup deste ano focou em histórias e biografias ligadas à diáspora africana, com 90% das convidadas sendo mulheres negras. O que um evento como esse representa, a seu ver? Qual a importância que tem?

Aparecida - A inspiração. É um evento inspirador, primeiro porque entendemos que não estamos sozinhas elaborando a arte. Ampliamos as nossas referências. Ao ler outra escritora, ao ouvi-la falar, isso toca em coisas que também pensávamos, mas não tínhamos segurança de afirmar.

Ao mesmo tempo, para o público de modo geral, (a importância) é entender isso com mais complexidade. Entender que não é um elemento isolado da cultura ou da literatura brasileira. É um movimento de mulheres negras afrodispóricas. Os nossos trabalhos dialogam, criam uma ponte de diálogo um em outro. E isso é fundamental, porque foi assim que a gente sobreviveu.

Eu estou hoje aqui podendo contar essas histórias porque muitas mulheres fizeram ponte de sobrevivência entre si. Se não, teria vencido a teoria do embranquecimento no Brasil no final do século 19, que disse que a minha geração não funcionaria. Seria embranquecida completamente e esqueceria que somos negras.

BBC News Brasil - Quando seu avô faleceu, você conta que sua família achou um baú embaixo da cama com uma edição do poema O navio negreiro, de Castro Alves, que ficou para você. Quando foi que a história da escravização entrou na sua percepção? Ou mesmo ser negra, quando você começou a refletir sobre isso?

Aparecida - Primeiro que refletir sobre ser negra no Brasil não é simples, porque estamos falando de um país absurdamente racista, e o racismo é marcado por traços físicos e estereótipos. Quanto mais uma pessoa tem registros no corpo, mais ela pode se aproximar ou se afastar.

Para as mulheres pardas, a identificação com uma mulher negra não é simples. Comecei a me entender como mulher negra porque a minha avó dizia isso, “somos uma família negra”, apesar de termos pessoas de diferentes tons de pele no núcleo familiar.

Mas é a sociedade que diz que sou uma mulher negra. Foi o mundo que primeiro disse que sou negra. Foi a escola, do jeito mais perverso possível.

Quando eu tinha 12 ou 13 anos, uma vizinha me levou para relaxar o cabelo. Quando cheguei à escola, foi um susto. As pessoas diziam, “nossa, eu nem sabia que você tinha cabelo”.

Quando eu defendi o meu doutorado, há uns 11 anos, fui ao teatro sozinha para comemorar. Estava feliz. Quando eu me sentei, uma mulher atrás de mim disse: “Pessoas com esse tipo de cabelo não deveriam frequentar esses espaços”.

Ela se sentiu incomodada porque meu cabelo estava armado e ela não conseguia ver o palco.

Então, são as pessoas que me dizem isso. Ser negra no Brasil é um lugar de incômodo. Obviamente somos muito diversas, e para uma mulher negra de pele retinta a experiência é completamente diferente, não dá para falar em uma perspectiva hegemônica.

Mulheres negras protestando à noite; uma delas levanta cartaz que diz 'Pela vida das mulheres pretas'

CRÉDITO,GETTY IMAGES

Legenda da foto,
Manifestação da Jornada Nacional de Luta Pelas Vidas Negras no Rio de Janeiro, em 2023; escritora afirma que, no Brasil, a vida dela 'às vezes corre perigo'

BBC News Brasil - Você costuma se afirmar como mulher negra, baiana, nordestina. O seu impulso pela literatura tem a ver com esses traços identitários, com um desejo de falar deste lugar?

Aparecida - O meu impulso pela literatura tem a ver com um desejo de vida. Como no Brasil minha vida às vezes corre perigo, acionar um lugar de escrita é acionar um lugar de existência, porque estou defendendo a minha vida, em alguma medida.

Quando eu escrevo, em alguma medida, estou criando um mundo possível para o meu corpo viver no Brasil, o que nem sempre é possível. Mata Doce tem como personagens principais duas mulheres que vivem um relacionamento amoroso, são velhas, vivem numa comunidade rural e adotam uma criança.

Esse não é um núcleo familiar que possa viver em paz no Brasil. Se a gente vai para as estatísticas, o feminicídio, para dizer o mínimo... Nem quero ficar trazendo isso, porque às vezes é cansativo ficar acionando esses lugares de violência.

Mas acho que escrevo para estar... Eu não sei o que é não escrever. Comecei a escrever adolescente, ali na transição entre a infância para a adolescência. Quando eu tinha 11 anos, ganhei um diário e comecei a escrever. E aí nunca não escrevi. Então eu não sei muito o que seria não escrever.

BBC News Brasil - Mata Doce é o primeiro livro que você assinou com o seu nome. Antes, você usava pseudônimos. Em uma entrevista você contou que tomou coragem após visitar mulheres em uma prisão. Como foi essa história?

Aparecida - Eu sempre escrevia livros e os deixava em casa. Eu já devia estar no sétimo exemplar. Eu mesma fazia o livro. Na adolescência, eu datilografava. Depois, passei a fazer no computador. Imprimia e costurava todas as páginas.

Em 2011, eu estava escrevendo um livro com a personagem de uma mulher que havia estado presa – Florim, que depois foi publicado com a assinatura Ruth Ducaso. Aí uma amiga em comum disse que eu tinha que conhecer a Denise Carrascosa, professora da Universidade Federal da Bahia, porque ela realizava oficinas no presídio.

Até então, eu nunca tinha publicado em uma editora. Eu fazia livros de artista, um único volume, e guardava em casa. E eu nunca tinha dito em público, “eu escrevo”.

BBC News Brasil - Você não mostrava esses livros para ninguém?

Aparecida - Não, não mostrava. Eu tinha muita vergonha. Eu não falava pra ninguém. Mas precisei dizer para a Denise e explicar que estava fazendo uma personagem. Ela falou, tá, você pode ir comigo, mas vai ter que dizer isso para as mulheres, dizer qual é a sua. Eu pensei, meu Deus, vou ter que falar em público que eu escrevo, que desespero.

Quando chegamos lá, havia um grupo de umas 15 mulheres no pátio do presídio para a aula de Denise, mas muitas outras estavam lá, e algumas mulheres iam ser liberadas. Quando uma mulher presa vai sair, as outras gritam muito, batem copos na cela para comemorar, era um barulho muito grande.

Eu aproveitei do barulho para contar de um jeito que não se ouvisse muito. Eu disse, gente, fiquem bem perto de mim porque eu tenho um segredo para contar. “Eu sou escritora”. Foi a primeira vez que eu oralizei em um lugar.

Acho que isso é muito significativo. As estatísticas de mulheres negras presas no Brasil são absurdas, são várias complexidades. Mas falo no lado simbólico – ao pensar o que é ser uma mulher negra presa no Brasil no campo simbólico.

Eu era uma escritora presa. Por não entender que eu podia, numa cena pública, dizer assim: eu escrevo, eu sou escritora.

Não é simples. Não é simples para uma mulher numa sociedade machista e patriarcal assumir lugares. Aí se a gente vai acrescentando: mulher negra, mulher nordestina, mulher LGBT, é muita sacola que a gente tem que carregar.

A Gloria Anzaldúa diz que escrever é poder colocar alças no mundo para melhor segurar. Então é isso, é muita sacola que a gente tem que segurar. E se sustentar em pé, ereta, com muita sacola, não é simples. Então ali, de algum jeito, eu me senti, por mais contraditório que pareça, acolhida, segura. Foi assim que se deu.

FONTE: BBC NEWS - 20/11/2024

Rio: Ronilso Pacheco, Teólogo e pesquisador fala sobre dificuldade de esquerda falar com evangélicos e diz haver 'hostilidade e preconceito'

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Ronilso Pacheco é teólogo e pesquisador - Foto: Brasil de Fato
"Você tem uma parte da extrema direita no Brasil que está associada com o povo religioso."



Teólogo pela PUC-Rio, pastor pela Comunidade Batista em São Gonçalo e mestre em religião e sociedade pelo Union Theological Seminary, da Universidade de Columbia, Ronilso Pacheco critica a visão "hegemônica e universal" sobre a Bíblia, que construiu um cristianismo branco.

A Lélia Gonzalez falava do euro cristianismo, que é muito associado com o colonialismo e a expansão marítima, que, de alguma forma, consolidou uma interpretação da Bíblia e de seus personagens, que inviabiliza a importância do povo negro e do continente africano… Então, a teologia negra surge nessa perspectiva, é o povo negro dizendo também o que dizer sobre Deus e a partir das escrituras”, explicou Pacheco, que é diretor do Instituto de Estudos da Religião (Iser).

Para o teólogo, a falta de diálogo da esquerda com os evangélicos não pode ser explicada como um problema das eleições deste ano, mas como um “erro histórico” que precisa ser resolvido com a construção de outro olhar sobre esse setor da sociedade.

“Esse fenômeno tem vários fatores importantes, mas um deles, que não pode ser pensado como erro da eleição, é um erro longo histórico, de uma certa resistência, hostilidade e preconceito de uma parte significativa do campo progressista brasileiro, que é acadêmico e intelectual, com o lugar da religião, sua inserção na vida política e com os evangélicos em especial, mas com os pentecostais mais especialmente ainda”, finaliza Pacheco, convidado do BdF Entrevista desta semana.

Confira um trecho da entrevista e o programa completo em vídeo:

Brasil de Fato: Queria começar nossa conversa falando sobre a teologia negra. O que é afinal?

Teologia negra é pensada e construída a partir da experiência e da vivência do povo negro, da comunidade negra, a partir da experiência no continente africano que responde a essa ideia. É um certo enfrentamento a uma ideologia que se coloca como hegemônica e universal, que é obviamente uma teologia pensada a partir do continente europeu. Seja dos teólogos católicos ou protestantes. A Lélia Gonzalez falava do euro cristianismo, que é muito associado com o colonialismo e a expansão marítima, que, de alguma forma, consolidou uma interpretação da Bíblia e de seus personagens, que inviabiliza a importância do povo negro e do continente africano… Então, a teologia negra surge nessa perspectiva, é o povo negro dizendo também o que dizer sobre Deus e a partir das escrituras.

É uma tese absolutamente progressista, sendo defendida na academia, que é um ambiente majoritariamente progressista. Mas e dentro das igrejas, como ela é recebida?

No Brasil, é um movimento de algumas décadas, com muitas idas e vindas. Muita gente não conhece a teologia negra e uma das razões para não conhecer é que há uma resistência em parte das igrejas. Diferentes da experiência dos EUA, o Brasil não tem uma igreja negra, politicamente pensando. O Brasil tem pessoas negras nas igrejas, são a maioria. Para essas pessoas, não chega a ideia de uma teologia negra, então tem um acolhimento e um desconforto. Muitas lideranças acusam a teologia negra de dividir a igreja e reforçar a questão racial, tem igrejas que não querem nem ouvir falar, porque dizem que teologia “não tem cor”. Agora, tem um movimento interessante, com cada vez mais jovens se aproximando da teologia negra e se reconhecendo negro.

Nós saímos das eleições no país com o PT repensando seu lugar na política. Figuras públicas do partido têm discutido publicamente sobre a perda de base social do partido, especialmente nas periferias e igrejas. Por quê, em sua opinião, o PT e a esquerda, que eram correntes dominantes no catolicismo, não conseguem dialogar com evangélicos?


Esse fenômeno tem vários fatores importantes, mas um deles, que não pode ser pensado como erro da eleição, é um erro longo histórico, de uma certa resistência, hostilidade e preconceito de uma parte significativa do campo progressista brasileiro, que é acadêmico e intelectual, com o lugar da religião, sua inserção na vida política e com os evangélicos em especial, mas com os pentecostais mais especialmente ainda. Quando falamos de evangélicos na periferia, estamos falando dos pentecostais… A religião e o evangélico pentecostal entram no lugar de um certo exotismo, eu gosto muito da ilustração do olhar para a periferia, para os evangélicos, em especial, como pessoas com a cabeça vazia que poderia ser ocupada por quem chegar primeiro. Então, se a esquerda chegasse primeiro, levaria essas cabeças. Se a direita chegasse, como chega, levaria. E esse público? Ele não pensa nada.

Por outro lado, para não falar apenas das deficiências da esquerda no diálogo com a igreja, eu vi uma declaração interessante sua, dizendo que a “extrema direita usa a gramática religiosa para um projeto de radicalização”. Quais subterfúgios dessa gramática são tão acessíveis à extrema direita?

São duas frentes distintas. Você tem uma parte da extrema direita no Brasil que está associada com o povo religioso, católico e evangélico. Estamos falando dos evangélicos, mas sempre bom dizer que os católicos têm um papel importante nisso e passam quase sempre despercebidos. Você tem grandes lideranças que usaram suas igrejas como encubadoras de radicalização e fundamentalismo, com aproximação e colaboração muito forte com o governo Bolsonaro. O Iser fez uma pesquisa e descobriu que diminuiu o número de candidatos que usavam palavras “pastor” e “irmão”. No entanto, aumentou o número de candidatos que se apresentam fazendo questão de enfatizar que são tementes a Deus ou que são crentes, ou que elas acreditam em pátria, Deus e família. Então, começamos a perceber esse movimento de que, embora não seja diretamente religioso, ou não assuma uma conotação religiosa, a gramática religiosa é usada porque a religião tem uma capacidade de articulação importante. Então você não precisa estar ligado diretamente à igreja, mas sabendo usar os termos e os jargões, você comunica. O Pablo Marçal fazia questão de associar o projeto político dele ao reino. O jornalista pode não saber, mas os evangélicos sabem que quando ele fala “reino” está falando do reino de Deus.

Edição: Martina Medina -Brasil de Fato em 20/11/2024