quinta-feira, 8 de dezembro de 2022

Do Metrópoles: Cenas da Copa, a festa das excelências em Doha

Os deputados José Rocha e Paulo Azi na Copa do Mundo, em DohaReprodução

DOHA e BRASÍLIA – A Copa do Mundo é uma festa e, como acontece sempre com as melhores festas, as excelências de Brasília não poderiam ficar de fora – deixando o interesse público de lado, para variar.

Doutor Luizinho, nome de guerra do deputado federal do Rio de Janeiro Luiz Antonio de Souza Teixeira Júnior, não deixou a oportunidade passar.

Ontem, ele flanava alegremente por Dubai. Sim, Dubai. Como era um dia sem jogos na Copa, o deputado aproveitou que estava perto – cerca de 600 quilômetros separam Doha da futurística cidade dos Emirados Árabes Unidos – e foi até lá dar um passeio. Uma esticadinha básica. Ele voltará para o Catar a tempo de ver a partida das quartas de final, na sexta.

Filiado ao PP, Doutor Luizinho chegou a Doha no último fim de semana. Foi com o filho e dois sobrinhos. Ele jura que viajou por conta própria, sem gastar um tostão de dinheiro público, mas escapole ao explicar por que deixou o Congresso em pleno período de trabalho. “Faz parte da vida”, diz.

Na capital do Catar, o deputado escolheu ficar no luxuoso Hilton The Pearl, um cinco estrelas encravado numa das áreas mais concorridas e caras da cidade, a “Pérola”, onde se concentram lojas de alto luxo e restaurantes estrelados. Durante a Copa, o hotel está abrigando torcedores abonados, familiares de jogadores e convidados da Fifa. Nesta quarta, uma única diária em uma das raras suítes disponíveis ali para reserva saía por pouco mais de R$ 10 mil.

10 mil.

ReproduçãoO deputado Doutor Luizinho no estádio 974 na segunda: em Doha, mas registrando presença em Brasília
O deputado Doutor Luizinho no estádio 974 na segunda: em Doha, mas registrando presença em Brasília

Luizinho comunicou à Câmara que estaria fora do país de 3 a 12 deste mês. Só que, na última segunda-feira, dia 5, quando já estava no Catar para ver a Copa de perto, ele misteriosamente registrou presença no sistema eletrônico da casa – um evidente absurdo.

A explicação? “Como deram pra gente a possibilidade de trabalhar à distância às segundas e sextas-feiras, eu trabalhei à distância”, defende-se o deputado, indagado sobre sua “presença-fantasma” no Congresso mesmo estando a quase 12 mil quilômetros de Brasília. Ele afirma que fez o registro “a pedido da presidência” da Câmara.

Enquanto o sistema registrava Luizinho presente, ele assistia da arquibancada do estádio 974 à partida em que o Brasil derrotou a Coréia do Sul por 4 a 1. O deputado é vice-líder do PP, um dos pilares do Centrão e da base do governo de Jair Bolsonaro. Em 2021, ele chegou a ser cotado para assumir o Ministério da Saúde no lugar do notório general Eduardo Pazuello.

“Viajei bancado com meus recursos, sem qualquer convite oficial. Qualquer ser humano que tenha uma necessidade e julgue importante parar seu trabalho para fazer um evento com a sua família, pagando seus próprios custos, acho que é importante. Infelizmente, trabalhamos numa profissão em que a gente não tem possibilidade de negociar as nossas férias. (…) Se eu estivesse na minha clínica, como médico, eu iria parar de qualquer maneira”, disse o deputado.

Ausente, mas presente

Outro deputado que, assim como Luizinho, marcou presença no sistema da Câmara, mas estava no Catar é o baiano José Rocha, do União Brasil. Rocha, aliás, praticamente tirou férias para acompanhar a Copa. Pouco antes de desembarcar em Doha, ele viajou para a COP-27, em Sharm El-Sheik, no Egito.

A viagem para a Conferência do Clima da ONU foi praticamente emendada com a temporada no vizinho Catar. Foi só acabar o evento no Egito, do qual participou à custa da Câmara, que o deputado comunicou à casa que ficaria mais 30 dias fora do Brasil: de 20 de novembro, dia do início do torneio, até 20 de dezembro, dois dias após a grande final.

Assim como o colega, Rocha está bem instalado em Doha, em um confortável hotel da rede internacional Marriott. O deputado, que já foi cartola do Vitória da Bahia, está acompanhado da mulher. Ele disse à coluna que paga a viagem com dinheiro do seu próprio bolso: “Foi particular, ônus pessoal. Estou aqui com meu recurso pessoal”.

Indagado sobre o motivo de ter registrado presença no sistema da Câmara em 5 de dezembro, quando já estava fora de Brasília, ele não respondeu. Tampouco falou sobre passar tanto tempo, um mês inteiro, longe do trabalho.

José Rocha foi vice-líder do governo Bolsonaro na Câmara de maio de 2019 a julho de 2020. Hoje, é vice-líder do União Brasil. Recém-eleito para seu oitavo mandato consecutivo, integra a Comissão de Esporte da Câmara. Há quatro meses, ele virou notícia ao propor a criação de um grupo de trabalho para acompanhar a preparação da Seleção para a Copa. Na ocasião, garantiu que a ideia não era um atalho para ver os jogos por conta dos cofres públicos. “Não queremos viajar”, afirmou.

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Mais um casal-torcedor

O deputado federal Paulo Azi, mais um do União Brasil da Bahia, chegou ao Catar a tempo de ver o jogo de estreia do Brasil, contra a Sérvia, em 24 de novembro. Assim como o conterrâneo José Rocha, viajou acompanhado da mulher.

No estádio Lusail, os dois deputados viram a partida na companhia de Ciro Nogueira, ministro da Casa Civil de Bolsonaro, e do vice-presidente do União Brasil, Antonio Rueda.

À diferença dos dois colegas, Paulo Azi não registrou presença na Câmara no período de ausência.

Procurado pela coluna, o deputado não respondeu às tentativas de contato. Na tarde desta quarta-feira, não havia ninguém em seu gabinete.

Registro irregular


A lista de deputados federais que viajaram ao Catar durante a Copa vai mais além. Estão nela o presidente da Câmara, Arthur Lira, do PP de Alagoas, e Eduardo Bolsonaro, do PL de São Paulo, que estiveram no país ainda durante a fase de grupos da competição.

A coluna perguntou oficialmente à Câmara se parlamentares em viagem ao exterior podem registrar presença, como fizeram Doutor Luizinho e José Rocha. A resposta foi que o registro é permitido apenas para parlamentares em missão oficial. A dupla, portanto, não poderia ter feito o que fez. Mas esse, provavelmente, será apenas mais um deslize que passará batido na farra permanente em que vive o poder de Brasília, com ou sem Copa do Mundo.

Fonte:RODRIGO RANGEL/METROPOLES - 08/12/2022

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