Fotos: Max Haack/ Ag. Haack/ Bahia Notícias
Em uma eleição com duas candidatas mulheres disputando o principal cargo de uma instituição, o machismo, em seus diversos aspectos, infelizmente também esteve presente. A eleição da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção Bahia (OAB-BA) deste ano é um marco histórico. Mas também, aponta para a misoginia que ainda impera nos ambientes de poder.
O ato contra a candidata derrotada Ana Patrícia Dantas, registrado na manhã desta quinta-feira (25), revela apenas um aspecto de como o machismo, por vezes, se manifesta. “Eu fui chamada de ‘puta’ na Bahia inteira, ‘puta e traídora’”, revela Ana Patrícia, após o ataque desta quinta-feira. “Homens e mulheres me chamaram de traidora e ingrata”, conta, acrescentando que mulheres, por muitas vezes, também são machistas pela construção social.
“Essa campanha foi muito machista. E a ofensa foi muito grande. Isso me entristece em uma certa medida, mas busco trabalhar na minha cabeça para não me abalar. Esses fatos só me dão certeza que eu fiz a coisa certa para minha vida ao sair de um ambiente tão machista”, afirma.
Ana Patrícia afirma que, quando soube quem estava a chamando de puta, procurou o presidente atual da OAB-BA, Fabrício Castro, e comunicou o fato, para que soubessem o que estava ocorrendo. “Eles sabem, eu comuniquei e não teve nenhuma palavra”. Ela reclamou que também relatou os fatos na comissão da Mulher Advogada e não recebeu nenhuma resposta sequer.
Ana Patrícia avalia que às mulheres, para algumas pessoas, cabe o papel de trabalhar apenas em órgãos políticos, e não o de pensar políticas, e quando se insurgem recebem os mais diversos adjetivos, como o de traidora. “Veja bem: em 2012, quando Luiz Viana rompeu com a chapa de Saul Quadros, ele não foi chamado de traidor. Quando rompeu agora com Felipe Santa Cruz, também não recebeu esse adjetivo e a Bahia aplaudiu e não considerou Viana como traidor”, avalia. “Me chamaram de ingrata, mas por quê? Eu doei meu tempo de trabalho, de forma voluntária, o tempo inteiro. E a gratidão precisa ser recíproca. Eles também precisam ser gratos a mim”, reclama. Ela conta que, na eleição de 2018, uma pesquisa interna feita pelo grupo apontava que ela tinha mais capital político que Fabrício Castro, e mesmo assim a preferência foi por fazê-lo presidente, emprestando seu capital político para a campanha dele como vice-presidente.
Já a candidata-eleita, Daniela Borges, ao programa Bahia Notícias no Ar, da Rádio Salvador FM, afirmou que também sofreu ataques machistas, mas de forma velada. “No final das contas, a gente percebe que algumas críticas foram tecidas no contexto da campanha, dentro de um contexto de desigualdade de gênero que a gente vive em nossa sociedade. Quando olhamos algumas críticas feitas ao fato, por exemplo, de eu e Christiane Gurgel sermos professoras, questionamos: tantos ex-presidentes da OAB foram professores, e isso nunca foi demérito”, compara.
Ela ainda acrescenta outro aspecto: “Vivemos em um país que valoriza muito pouco a educação, e muito pouco os professores. E, até mesmo dentro do contexto dos professores, o que a gente vê normalmente, são os professores homens sendo mais valorizados”, analisa. Na primeira infância, por exemplo, Daniela Borges destaca que boa parte das professoras são mulheres e menos valorizadas em todos os aspectos, se dedicando a ensinar crianças em um momento tão importante da educação. “A gente vê que uma das primeiras construções feitas na campanha é essa relação, de descredibilizar a nossa advocacia, o quanto a gente atua na advocacia e na docência”, frisa.
A nova presidente da Ordem baiana acredita que, com o tempo, essa realidade será transformada. “Hoje, nós temos duas mulheres que vão dirigir uma seccional, duas advogadas, duas professoras que têm uma trajetória. Isso é uma inspiração. As advogadas são o maior número de inscritos na OAB da Bahia. Estamos mudando essa cultura. Vamos fazendo nosso trabalho e mudando isso”.
Sobre os ataques dirigidos a Ana Patrícia, Daniela Borges repudiou os atos, apesar de ter não ter tomado conhecimento prévio. “Qualquer tipo de violência, a quem quer que seja, deve ser repudiado. Estávamos adversárias, tenho o maior respeito por ela, e qualquer tipo de agressão às mulheres e às pessoas tem que ser repudiado”, reforçou.
Fonte: BN/reprodução - 26/11/2021
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