Mata doce, de Luciany Aparecida, é uma história matriarcal de traumas, lutos e beleza, diz revista piauí - foto:reprodução
“E
m Mata doce, o tempo não permitia distanciamentos. Tendo ou não alguém para ouvir histórias, a própria geografia do lajedo, da mata, das estradas ajeitava enredos.”
Uma das melhores leituras que fiz neste ano de 2023 foi a do livro Mata doce, da escritora baiana Luciany Aparecida. É o primeiro romance da autora, que já publicou outros livros sob o nome de Ruth Ducaso – que ela não considera um pseudônimo, mas um projeto estético-político.
Mata doce dá nome a um vilarejo situado no interior da Bahia. Somos introduzidos às histórias de seus habitantes por meio de Maria Teresa da Vazante, matadora de bois e datilógrafa, filha adotiva de Mariinha e de Tuninha. Conhecemos Maria Teresa a partir de seu rebatismo, já que logo nas primeiras páginas do romance ela comunica: “Agora sou Filinha Mata-Boi.” A narrativa irrompe na dureza da ação, enquanto Maria Teresa assume o papel que, tradicionalmente, pertencia aos homens da região.
Todos os personagens são negros, com exceção do coronel Gerônimo Amâncio, o primeiro a duvidar que Maria Teresa, cria de duas mulheres, pudesse dar conta de dar fim aos bois. Apesar da presença de personagens masculinos, é uma história essencialmente matriarcal, que se materializa na existência da própria Maria Teresa, da professora Mariinha, da travesti idosa Tuninha, da ex-prostituta Lai, entre outras.
A partir do velho casarão onde moram as três principais personagens, navegamos na história familiar (aqui, família assume uma abordagem nada tradicionalista) que, cercada pela memória, expressa traumas e lutos, mas também beleza e leveza. O livro nos transporta para essa atmosfera rural e interiorana da Bahia, que lembra, sobretudo pela ambientação, o celebrado Torto arado, de Itamar Vieira Junior. O livro de Luciany apresenta uma narrativa épica que vale ser lida e apreciada, trazendo um belo retrato da literatura que está sendo produzida hoje no país.
fonte: Emily Almeida/Revista Piauí/reprodução
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