domingo, 28 de março de 2010

Brasil memória: Eriberto França diz que não faria o que fez em 1992, quando denunciou esquema na CPI do PC Farias



O esquecimento incomoda, a falta de reconhecimento machuca. Eriberto França fala com amargura de tudo o que viveu depois de ter prestado o depoimento que derrubou o ex-presidente Fernando Collor, em 1992. Após 18 anos, a certeza de que nada mudou, apesar do sacrifício pessoal, leva o motorista a responder com convicção quando questionado se faria tudo de novo: “Não faria. Quem quiser acreditar em história de políticos bonzinhos e honestos, acredite. Fiz meu dever de cidadão. Fiz tudo isso e está tudo do mesmo jeito.”

Hoje com 47 anos, grisalho, olhar firme, ele responde sem vacilar a qualquer pergunta. Mantém a simplicidade do cidadão comum que foi um dos principais atores do maior escândalo político após a redemocratização. Quando relata as tentativas de falar com integrantes da cúpula do governo petista, as palavras são de revolta: “Será que eles têm medo do Eriberto porque sou honesto? Quero ver passarem o sufoco que passei. Um cidadão simples, para enfrentar o que eu passei, com coragem e dignidade. Os amigos me dizem: ‘Não era para você estar esquecido’. Mas estou”. Diz que, no governo petista, houve “falta de reconhecimento, porque tenho uma parcela nisso. Pode ser um grão de areia, mas ajudei”.

A expressão fechada se desfaz quando ele fala dos momentos de glória, quando percorria o país recebendo homenagens. O que incomodava era a proteção dos agentes federais. “Às vezes, pisava em metralhadora dentro do carro. Para tomar uma cervejinha, tinha que despistar os caras.”
Apertos
Quando pediu demissão da Radiobrás (atual EBC), logo após prestar depoimento na CPI do PC, em julho de 1992, ficou desempregado. Partiu, então, para a iniciativa privada. Vendia nas ruas de Brasília toalhas bordadas que comprava em Ibitinga (SP). Mas levou “cano” e desistiu. Passou por apertos até conseguir um emprego no Ministério dos Transportes em 1995, na gestão do ministro Odacir Klein (PMDB). Ficou lá por todo o governo Fernando Henrique. Foi sondado por vários partidos para ingressar na política, mas rejeitou. “Não dá certo. Eu entro no esquema dos caras ou vou morrer cedo. Tem que fazer o jogo dos caras”.

Para sua surpresa, foi demitido logo após a posse do ministro Anderson Adauto, no início do governo Lula. “Aquele ministro, investigado por corrupção, exonerou eu e minha esposa”. Ele reconhece que, logo após a sua demissão, foi recontratado pela Radiobrás, com a ajuda do senador Aloisio Mercadante (PT-SP).

Eriberto procura deixar claro que não planejou nada do que ocorreu na época. “Não procurei ninguém. Fui procurado pela IstoÉ no Cruzeiro, onde morava. Depois, fui convocado para testemunhar (na CPI do PC). Fui lá para falar a verdade, que eu não podia esconder”. Ele começou a trabalhar para Collor na campanha, contratado por uma locadora de veículos. “Eu era um boy de luxo. Fazia saques e depósitos. Transportava valores. Faziam até depósito em meu nome para eu sacar”, lembra. Ele contou tudo na CPI e mostrou o caminho que levou aos “fantasmas” de Collor. Foi o ponto de partida para a queda. Reportagem por Lúcio Vaz, publicada no Correio Braziliense de 28/03/10.
Imagem revista: Google

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