Livreiro é vendedor? Sim. Mas não
somente. Há uma magia na profissão, que, no contato direto com o leitor, abre
espaço para o universo literário. É um “algoritmo humano” no fantástico mundo
das livrarias físicas, como traduz Heider Oliveira, soteropolitano, estudante
do 4º semestre de Ciências Sociais da Universidade Federal da Bahia (Ufba),
eleito Livreiro do Ano pelo Prêmio Catavento, categoria inserida na sétima
edição do Prêmio PublishNews.
A premiação do baiano descortina
algumas camadas da indústria literária no Brasil. É um profissional jovem, que
está fora do chamado “eixo literário” – Sul/Sudeste –, além de desenvolver um
trabalho sob a perspectiva da presença, da troca e da experiência coletiva.
Ele convoca as pessoas a saírem de suas casas
em um momento em que as vivências individuais ganharam centralidade - agravadas
pela pandemia da covid-19 - e que o
cotidiano segue cada vez mais hiperconetcado. No segmento literário, some-se o
avanço do fenômeno BookTubers, das listas de livros hypados no TikTok, o boom
das vendas online e a crise das grandes redes de livrarias.
Em novembro de 2021, desempregado
em meio à pandemia, Heider decidiu transformar sua longa trajetória de leitor,
iniciada na infância por incentivo da mãe, em fonte de renda. Deixou um
currículo na livraria LDM com uma missão pessoal muito bem definida. Queria
mais do que um emprego que lhe garantisse um salário ao final do mês. A ideia
era dinamizar o espaço, fomentar a difusão cultural e contribuir com uma
característica muito particular da rede baiana de livrarias: difundir o
potencial literário do Nordeste, sobretudo autores baianos.
“Levar meu conhecimento de leitor para esse espaço. Eu achei que poderia funcionar. A livraria é um espaço que dizem estar fadado ao desaparecimento diante de todas as inovações que o mercado vem trazendo”, enfatiza. Desde então, ele tem organizado lançamentos, participação em eventos, feiras, encontros entre escritores e leitores e clubes de discussão, entre outras maneiras de levar as pessoas para dentro da livraria.
Um clube para chamar de seu
Uma das experiências que
pavimentou o caminho para a conquista do título de Livreiro do Ano foi o
trabalho de Heider como curador e mediador do clube de leitura LDM do Shopping
Paseo, no bairro Itaigara, onde ele trabalha. Ele foi convidado pessoalmente
para coordenar o projeto, iniciado há sete meses. Antes, já utilizava o espaço
para reunir associados de outros clubes de leitura, como os da TAG Curadoria.
Livreiro baiano ganha título nacional na categoria
Heider Oliveira transformou sua
paixão pela leitura em profissão (Foto: Marina Silva/CORREIO)
“O leitor que frequenta a
livraria LDM conhece o mercado editorial, as publicações das grandes editoras.
O que me proponho a fazer é oferecer livros de editoras menores, independentes,
livros que não estão no radar midiático. A ideia é que a gente faça uma viagem
por diferentes países a cada mês. Já passamos pela Nigéria, pela Coreia do Sul,
pelos Camarões, Turquia”, explica Heider.
O incentivo para a inscrição na
premiação veio da escritora baiana Yara Fers, que tem entre suas obras Anatomia
de um Quase Corpo. Além de ter tido seu livro lançado no local, com organização
de Heider, ela também é participante do clube de leitura. “Ele leva para a
livraria obras que estão fora do circuito, mas que trazem questões importantes.
Faz indicações que agregam, conhece livros diversificados. Em uma conversa, ele
vai te indicar um livro de acordo com o seu perfil. É incrível!”, elogia.
Reconhecimento
O currículo livreiro de Heider já
conta com mais de 100 pessoas inscritas no clube de leitura da LDM – que rende
uma média de 200 livros vendidos por mês -, organização de seis encontros
literários, cinco lançamentos e a inserção de mais de 10 editoras no catálogo
da livraria.
“O Heider é aficionado pelos
livros, pela literatura e muito dedicado ao seu trabalho. Além de já ter o
hábito e, diria mais, a compulsão pela leitura de livros, especialmente
físicos, ele lê para obter conhecimento de produto e possibilitar o
desenvolvimento de suas diversas atividades. Está sempre ligado, em 330V”,
destaca Primo Maldonado, diretor da rede.
A categoria Livreiro do Ano
passou pelo voto popular. Na reta final, Heider concorreu com profissionais já experimentados no
mercado, que atuam nas cidades de São Paulo (Megafauna) e Campinas (Leitura).
“Fiz a inscrição não acreditando muito porque eu estava concorrendo com pessoas
do Sudeste e Sul do país. E não é que o negócio aconteceu? Fui com o sentimento
de gratidão de estar segurando o top 3, mas em nenhum momento passou pela minha
cabeça que eu iria vencer”, conta. A entrega do prêmio aconteceu em São Paulo,
no início do mês.
A pedido do CORREIO, Heider
listou 10 indicações de leitura, lista a qual ele privilegiou autoras mulheres.
Confira:
1 - Toni morrison - A canção de
Solomon
2 - Karmele Jaio - A casa do pai
3 - Maria José Silveira - Maria
Altamira
4 - Maryse Condé - O coração que
chora e que ri: contos verdadeiros da minha Infância
5 - Jamaica Kincaid - A
autobiografia da minha mãe
6 - Atena Beauvoir - Contos
Transantropológicos
7 - Isabel Allende - A ilha sob o
mar
8 - Alice Walker - Em busca dos
jardins de nossas mães: Prosa mulherista
9 - Djaïli Amadou Amal - As
impacientes
10 - Yara Fers - A anatomia de um
quase corpo
Como fazer parte do clube de
leitura mediado por Heider?
Os encontros acontecem
presencialmente no segundo sábado de cada mês, sempre na livraria LDM do
shopping Paseo, às 16h. A inscrição no clube é gratuita. Os livros selecionados
para a leitura coletiva mensal são comercializados na própria rede com 15% de
desconto - nas filiais e no site.
0 comentários:
Postar um comentário