Tássio Cunha, Professor do Instituto Federal de Brasília – IFB, Graduado em Geografia (licenciatura/bacharelado) pela Universidade Federal da Paraíba – UFPB, Mestre em Engenharia Urbana e Ambiental também pela UFPB e Doutor em Geografia pela Faculdade de Ciência e Tecnologia da Universidade Estadual Paulista – FCT/UNESP. Natural de Irecê – BA e enraizado em Canoão de Ibititá – BA.foto:reprodução
Para entender o atual momento climático da região de Irecê, com chuvas intensas no período outubro/novembro, com previsão de se estender pelo mês de dezembro e ir até março, o site Cultura&Realidade solicitou análise e explicações ao ireceense Tássio Cunha, Doutor em Geografia, ele conhece a natureza local e os aspectos científicos que a envolve. Ouça o podcast da sua fala, sem edição.
“Tempo do verde” é a alegria das famílias sertanejas. Entende-se como “tempo do verde”, na região de Irecê, o período das chuvas, quando a vegetação nativa sai do seu estado de dormência e se permite verdejar por todos os cantos. Período em que a Caatinga se aviva em plenitude.
Antigamente, o ciclo do “verde” era entre setembro e dezembro. Nos tempos atuais, acostumou-se com o período de novembro a janeiro. O calendário agrícola oficial, por exemplo, é a partir do dia 10 de novembro. No mês de agosto, muitas famílias campesinas, que vivem das culturas de sequeiros, iniciam os preparativos dos solos para a safra agrícola. Mas a maioria prepara os solos a partir de outubro.
Este ano, entretanto, a maioria dos agricultores foi surpreendida com as chuvas em pleno mês de outubro, com boa intensidade, chegando a superar, somente naquele mês, os 300mm de precipitações em determinadas localidades. No final de novembro, já tinha propriedades medindo índices acima de 400mm.
Alguns especialistas falam que este ano a região de Irecê está sendo agraciada com o fenômeno La Niña, que ao contrário do El Niño, contribui com maior quantidade de chuvas. Mas há quem aponta outra possibilidade para o atual clima na região, bastante comum ao sistema climático.
Para esclarecer sobre isso, convidamos o Professor/Doutor em Geografia, Tássio Cunha, natural de Irecê e “enraizado” em Canoão de Ibititá, para, na condição de conhecedor da realidade social, cultural e climática da região e cientista que é, que atua no Instituto Federal de Brasília – IFB, possa contribuir com os nossos leitores, a interpretar este momento chuvoso na região de Irecê. Precipitações estas que prometem permanecer até março, sem, entretanto, o indicativo de regularidade.
De acordo com o Dr. Tássio Cunha, a menção de que Irecê vive o La Niña é fruto de um entendimento científico, mas ele acredita se tratar de um outro fenômeno similar. “há um conflitozinho, mais que natural. Não estamos passando por um ano de La Niña, mas por um resfriamento das águas do Pacífico, como característica do fenômeno La Niña, a partir de ventos frios trazidos pelo Alaska para a região equatorial, provocando características climáticas similares ao do fenômeno La Nina.
Ele salienta que “as águas do Pacífico estão resfriando na costa Oeste da América do Sul e parte leste do Oceano Pacífico, diminuindo a temperatura deste oceano, o que influencia nesta movimentação atmosférica, alterando as precipitações no Brasil e onde mais nos interessa, em nossa região.”
O cientista ressalta que independente do que está acontecendo, de qual levantamento científico está mais concreto, o importante é que as águas do pacífico estão resfriando, influenciando diretamente nas chuvas em nossa região, e com aumento quantitativo em relação aos anos mais secos.
Em sua fala, Tássio observa que esta condição (de muita chuva) vem se apresentando a partir de outubro, mais intensamente em novembro e dezembro… e que deverá sofrer diminuição, mas não muito declinante no mês de março, quando ocorrerá uma busca da normalidade das águas do Oceano Pacífico.
Mas, “o que que isso impacta em nossa região?”. Ele perguntou e respondeu: “esta condição ocorre essencialmente a partir dos sistemas atmosféricos, que são os maiores influenciadores das chuvas aqui em nossa região, e, consequentemente, a relação desses sistemas com a diminuição das temperaturas, estabelecendo a contribuição na quantidade das chuvas.”.
Ainda de cordo com Dr. Tássio, “a nossa região é conhecida nacionalmente, como Centro Norte Baiano, de clima semiárido e é influenciada diretamente por zonas de alta umidade, que possuem o seu epicentro na floresta Amazônica, na sua parte noroeste… e esta umidade é transferida pelas Zonas de Convergências, ora Intertropical, ora do Atlântico Sul. Esta última é a que está trazendo maior volume de umidade para a nossa região neste momento. É notável, a partir desta reflexão, que as chuvas que banham nossa região dependem sumariamente da umidade, trazida tanto do Oceano Atlântico, como dafFloresta Amazônica.”, explicou.
Para ele, a confusão se é ou não fruto do fenômeno La Niña, o atual momento das chuvas em Irecê, é que as influências dessa temperatura mais baixa das águas, que são também transferidas por macrocorrentes de ventos, ora saindo de baixa pressão, ora chegando de alta pressão, vão influenciar diretamente na direção desta umidade para as regiões Norte e Nordeste, propriamente dito, e a diminuição desta umidade para o sudeste e sul do Pais. Por isso, a ideia de que o La Niña, não em todo ano, contribui para os produtores de sequeiros da região ireceense.
Compatibilizar clima e desenvolvimento
Dr. Tássio Cunha, além de explicar sobre as razões do atual ciclo de chuvas na região, chama a atenção, em desfavor da dependência da adivinhação do clima para as atividades produtivas. “Partindo desta condição (clima), na minha humilde ideia, é mais que necessário que temos de entender este fenômeno climático e como eles atingem e influenciam na vida das pessoas. Não é preciso a gente jogar o jogo do adivinho, apostar nas chuvas que vem do céu em média, alta ou baixa pluviosidade. Devemos levantar o conceito de convivência com a seca”, aconselha.
“Infelizmente fomos direcionados, a meu ver negativamente, e para modelos de desenvolvimento impostos por outras nações como a norte americana…. que se encaminhou para os modelos agrícolas ainda predominantes na nossa região, com apoio dos militares na década de 70, com a tríade feijão, milho e mamona, resultando graves danos ambientais e sociais, afetando a vida da população, com migrações forçadas e promoção da desigualdade, expropriação, dívidas e degradação da vida humana”, pontua ele.
Para ele, este entendimento nos impõe a pensar o hoje, frente a esta questão do clima. Que sem dúvida deve ser pensado a partir das pessoas, não somente sobre suas estruturas, suas regras atmosféricas que por natureza é dinâmica e muito rápida. Temos de repensar o modelo de desenvolvimento, a partir do ambiente educacional, com vistas aos aspectos locais e promoção de matrizes tecnológicas de desenvolvimento adequadas à nossa realidade climática, recuperação de áreas degradadas e devolução da dignidade humana a partir da qualidade de vida no seu habitat.
Ouça, no podcast, gravado em novembro, a fala completa de Dr. Tássio Cunha.
O nosso podcast está disponível também no Deezer:
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FONTE: SITE CULTURA&REALIDADE/REPRODUÇÃO
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