quinta-feira, 9 de junho de 2022

Em encontro com Bolsonaro, Biden defende democracia e Amazônia

LOS ANGELES - O encontro do presidente Jair Bolsonaro com Joe Biden nesta quinta-feira, o primeiro entre os dois líderes, teve a pauta ambiental e a democracia brasileira como temas centrais. Os dois assuntos são caros para os americanos. Biden defendeu as instituições do País e elogiou o Brasil, como país, pela tentativa de proteger a Amazônia, enquanto Bolsonaro manteve sua retórica e afirmou que, por vezes, sente a soberania nacional ameaçada quando o assunto é a Floresta. O brasileiro disse que chegou ao poder pela democracia e sairá, também, pela via democrática e voltou a falar em “voto auditável”.

A imprensa pôde acompanhar a abertura da reunião, momento em que os presidentes normalmente trocam rápidos cumprimentos. Biden falou por cerca de um minuto e meio, em um discurso protocolar. “O Brasil é um lugar maravilhoso. Por sua democracia vibrante e inclusiva e instituições fortes, nossas nações são ligadas por profundos valores compartilhados”, afirmou. O americano também falou sobre a proteção da Amazônia, disse que o Brasil tem feito um bom trabalho para proteger a floresta e que defende que o “resto do mundo ajude a financiar a proteção” da área. “Nós todos nos beneficiamos disso”, afirmou. Também afirmou que já esteve no Brasil três vezes.

Já Bolsonaro discursou por cerca de seis minutos, quando deu justificativas para três assuntos sobre os quais é atacado: seu posicionamento sobre as eleições brasileiras, a proteção ambiental e a relação com a Rússia. Ele não recuou, no entanto, na retórica que tem mantido no Brasil.

Brasil na Cúpula das Américas

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Bolsonaro falou que o País terá eleições livres, justas e que trabalha para que sejam auditadas. “Nunca tivemos uma oportunidade tão grande de afinidades que o nosso governo tem. Este ano, temos eleições no Brasil. E nós queremos eleições limpas, confiáveis e auditáveis, para que não haja nenhuma dúvida após o pleito”, disse Bolsonaro. “Tenho certeza que ele será realizado neste espírito democrático. Cheguei pela democracia e tenho certeza de que quando deixar o governo também será de forma democrática”, afirmou.

O presidente Jair Bolsonaro disse ao presidente americano Joe Biden que o Brasil 'sabe preservar a Amazônia' e que sente a própria soberania ameaçada em relação ao interesse externo na região Foto: Evan Vucci/AP
© Fornecido por EstadãoO presidente Jair Bolsonaro disse ao presidente americano Joe Biden que o Brasil 'sabe preservar a Amazônia' e que sente a própria soberania ameaçada em relação ao interesse externo na região Foto: Evan Vucci/AP

A retórica do presidente brasileiro para atacar o sistema eleitoral, no entanto, passa pela alegação de que urnas eletrônicas não são auditáveis. Pouco antes da reunião com o americano, na saída do hotel onde está hospedado, Bolsonaro disse que o sistema é inauditável, o que é falso. Também antes do encontro, Bolsonaro disse que não faria comentários sobre as eleições americanas de 2020.

Último líder do G-20 a cumprimentar Biden pela vitória contra Donald Trump, Bolsonaro repetidas vezes repercutiu alegações do republicano que põem em dúvida a legitimidade da eleição de Biden. “Vocês sabem que eu tive um excelente relacionamento com o presidente Trump. Isso é passado”, afirmou, antes da reunião bilateral.

Bolsonaro mantinha com Trump uma relação de admiração e replicava, no Brasil, o estilo e as políticas do republicano. Durante os dois anos em que ambos exerceram a presidência, Trump recebeu Bolsonaro nos EUA duas vezes -- uma delas na Casa Branca e a outra na residência de verão do presidente americano, em Mar-a-Lago. Eles também se encontraram no G-20 em Osaka, Japão. Todos os encontros foram amigáveis e com declarações públicas de admiração. Quebrando uma tradição diplomática, Bolsonaro chegou a declarar sua torcida pela vitória de Trump.

A reunião com Biden foi bastante diferente. Os presidentes não sorriram, não deram aperto de mão em frente aos jornalistas e não se elogiaram. Em boa parte do tempo, Biden olhava para as próprias mãos enquanto Bolsonaro discursava e evitava o contato visual com o brasileiro.

Ao falar sobre a Amazônia, Bolsonaro citou dados de preservação. “A questão ambiental temos a nossa dificuldade”, disse Bolsonaro. “Mas fazemos o possível para atendermos o nosso interesse e também a vontade do mundo, mas, como disse, somos um exemplo para o mundo na questão ambiental”, afirmou. “Dois terços do Brasil são preservados. Mais de 85% da amazônia, também. Nossa legislação ambiental é bastante rígida e fazemos o possível para cumpri-la pelo bem do nosso país”, afirmou.

Desde que Biden tomou posse, o governo brasileiro foi pressionado a mudar sua política ambiental e se comprometer com ações concretas para redução do desmatamento. Em abril do ano passado, Brasília fez uma inflexão na sua retórica ambiental durante a Cúpula Climática promovida por Biden e, desde então, os americanos têm elogiado nos bastidores o compromisso do governo brasileiro sobre o assunto.

Clima

O presidente dos EUA tentou se manter o mais distante possível de Bolsonaro desde que chegou à Casa Branca, em janeiro de 2020. O encontro entre os dois foi costurado a contragosto por ambos. Biden se curvou à ideia de convidar Bolsonaro para um encontro bilateral diante do risco de sediar uma Cúpula das Américas esvaziada e depois de assistir a aproximação de Bolsonaro e de Alberto Fernández (Argentina) a Vladimir Putin, na iminência do início da guerra na Ucrânia.

O presidente americano Joe Biden sugere que o Brasil deveria permitir o resto do mundo a financiar a preservação da Amazônia, durante reunião bilateral com Jair Bolsonaro na Cúpula das Américas Foto: Evan Vucci/AP
© Fornecido por EstadãoO presidente americano Joe Biden sugere que o Brasil deveria permitir o resto do mundo a financiar a preservação da Amazônia, durante reunião bilateral com Jair Bolsonaro na Cúpula das Américas Foto: Evan Vucci/AP

Bolsonaro justificou sua visita a Putin, sem mencionar o nome do russo. “Sempre adotamos uma posição de equilíbrio. Lamentamos os conflitos, mas eu tenho um país para administrar e, pela sua dependência, temos que sempre sermos cautelosos, porque as consequências da pandemia com a equivocada polícia do ‘fique em casa’, agravada por uma guerra a dez mil quilômetros de distância do Brasil, as consequências econômicas são danosas para todos nós. E, lá no Brasil, em especial para os mais humildes, que enfrentam uma inflação em alimentos, bem como energia”, disse. O brasileiro costuma dizer que visitou Moscou com intuito de manter a relação comercial entre os dois países. “Então, presidente Joe Biden, estamos à disposição para colaborar na construção de uma saída deste episódio que não queremos entre Ucrânia e Rússia”, emendou Bolsonaro.

Com o encontro Biden tentou um equilíbrio delicado. Como anfitrião e responsável pelo convite a Bolsonaro, foi aconselhado a evitar o que os diplomatas chamam de “caneladas”. Por outro lado, foi cobrado por sua base política e de eleitores a cobrar Bolsonaro pela defesa do sistema eleitoral brasileiro, de compromissos ambientais e democráticos.

Nesta sexta-feira, Bolsonaro fará um curto discurso na plenária da Cúpula das Américas. Depois, terá encontros bilaterais com os presidentes da Colômbia, Iván Duque, e do Equador, Guilherme Lasso. Ele não se reunirá com os presidentes de esquerda do Chile, Gabriel Bóric, e da Argentina, Alberto Fernández. De Los Angeles, o presidente viaja a Orlando, na outra costa dos Estados Unidos, onde fará uma agenda política. Ele irá inaugurar o vice-consulado de Orlando, um pleito antigo dos brasileiros que moram no local. Reduto da comunidade brasileira nos EUA, a região concentra lideranças evangélicas e apoiadores de Bolsonaro no exterior. Ele deve participar ainda de uma motociata em sua homenagem e pode encontrar o blogueiro foragido da Justiça, Allan dos Santos, que estará na cidade.

Fonte: ESTADÃO - 09/06/2022 21h:50

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