sábado, 25 de abril de 2020

COVID-19: Estatísticas no Brasil mostram que relaxar o isolamento social pode ser desastroso

Inúmeras covas foram abertas em cemitério da Vila Formosa, em São Paulo, epicentro da COVID-19 no Brasil
© Miguel Schincariol/AFP/reprodução  Inúmeras covas foram abertas em cemitério da Vila Formosa, em São Paulo, epicentro da COVID-19 no Brasil
O ministro da saúde Nelson Teich, alinhado com o presidente Jair Bolsonaro(sem partido), afirmou que o governo prepara diretrizes para reduzir o isolamento social, uma vez que não há “crescimento explosivo” da COVID-19 no Brasil. No entanto, a análise do ministro não se sustenta quando confrontada com as estatísticas. Mesmo diante da subnotificação, um gargalo reconhecido pelas autoridades de saúde brasileiras, o país está entre os 15 países com o maior número de casos no mundo. Para entender a evolução da doença é preciso olhar para a taxa de mortalidade, o número de pessoas contaminadas a partir de um caso confirmado e como é o ritmo no aumento no número de mortes.
         
Ao se comparar o número de mortos, 3.670 óbitos pela COVID-19, com a população brasileira pode se chegar a uma conclusão equivocada. Não basta fazer a simples comparação entre população do país e números de mortos. O percentual em comparação com a população de 212,6 milhões pode parecer inexpressivo. Os Estados Unidos, com população de 331 milhões, têm 40 mil mortes. No entanto, ao olhar para os números é importante entender em que ponto da curva de evolução da pandemia o Brasil está – o que indica é que ainda não estamos no pico da pandemia. A base de comparação, os primeiros casos nos Estados Unidos, foram confirmados em 1º de janeiro. Já no Brasil, essa confirmação veio quase dois meses depois, em 26 de fevereiro.
Um estudo estatístico feito por grupo de pesquisa do curso de medicina do Centro Universitário de Belo Horizonte (UniBH) em parceria com o Comitê de Enfrentamento à COVID-19 em Minas, aponta para o R-0, um coeficiente que indica o número de pessoas que podem ser infectadas a partir de um paciente positivo. O número demonstra que a pandemia está sob controle nos países em que o R-0 fica abaixo de 1. Nesta lista, já estão Suíça, Espanha, Áustria, Itália e Israel. No Brasil, no entanto, o R-0 é 2,6. Com esse número seria necessário aumentar as ações de isolamento social para que haja controle efetivo da doença.
“Não se pode olhar apenas para o número absoluto. É preciso olhar a evolução do padrão da curva ao longo do tempo”, afirma o professor do UniBH Bráulio Roberto Gonçalves Marinho Couto. O pesquisador trabalha com números do CDC Europeu que apontam que 78% dos casos confirmados da COVID-19 estão concentrados em 16 países. 
Muitos ainda andam pelas ruas no Brasil sem se preocupar com aglomerações e proteção contra o vírus
© Nelson Almeida/AFP/reprodução Muitos ainda andam pelas ruas no Brasil sem se preocupar com aglomerações e proteção contra o vírus


MORTALIDADE

Outro número preocupante foi apresentado pelo Monitora COVID-19, sistema que agrupa e integra dados sobre a pandemia do novo coronavírus no Brasil, gerenciado pela Fiocruz. Os números mostram que as mortes provocadas pela doença têm dobrado, em média, num intervalo de cinco dias no Brasil. Comparativamente, nos Estados Unidos e no Equador, países com taxas altas de disseminação da epidemia, o intervalo para essa duplicação, em período similar, seria de seis dias. Na Itália e na Espanha, oito.
Os dados se referem às semanas de 29 de março a 4 de abril, 5 a 11 de abril e 12 a 16 de abril. São Paulo é o epicentro da pandemia no país, mas a evolução da doença é preocupante na Região Norte, marcadamente nos estados de Rondônia, Pará e Amapá, e no Nordeste, no Piauí, Alagoas, Ceará, Maranhão e Pernambuco.
Também preocupante é a taxa de mortalidade pela COVID-19 no Brasil. Na França, Itália, Inglaterra e Espanha, a taxa está em torno de 10%. No Brasil, em torno de 5%, mais do que o dobro da taxa verificada na China, 2%, conforme descrito por pesquisadores.
Os infectologistas alertam que não é o momento de flexibilizar as medidas de isolamento social. “Nas grandes e médias cidades esses números nos mostram que o distanciamento ainda é fundamental e que eventual flexibilização tem que ser feita com muita cautela, muita responsabilidade e sempre seguindo a epidemiologia local, ou seja, se você tem condições de começar uma flexibilização, comece paulatinamente e meça sempre para que a qualquer aumento, indício de descontrole para você manter a rédea curta ou um pouco mais frouxa com base em números e dados”, afirma o presidente da Sociedade Mineira de Infectologia, Estêvão Urbano.
O especialista alerta para a chegada do inverno, que torna mais propícia a disseminação do vírus. “Temos que pensar que estamos entrando no outono e inverno, qualquer flexibilização precipitada seria muito preocupante e poderia trazer consequências muito trágicas, diz. Ele ressalta que é preciso que as autoridades tenham firmeza. “Há que se ter bom senso. Entendemos a dificuldade da quarentena, mas é importante a preocupação de não deixar a bolha estourar e haver um colapso e cada local vai ter que tomar as decisões com base no seu cenário. Mas sempre com muita responsabilidade”, completa Estêvão Urbano.


QUARENTENA

O Brasil precisaria aumentar em até três vezes o número de pessoas em quarentena para conseguir controlar a pandemia do coronavírus. A conclusão é do estudo “Restrições de mobilidade para o controle da epidemia de COVID-19”, realizado pelo grupo de pesquisa do curso de medicina do Centro Universitário de Belo Horizonte e o Comitê Estadual de Enfrentamento à COVID-19, integrado pelo especialista Carlos Starling. O estudo trabalha com dados de deslocamento dos indivíduos a partir de informações coletadas pelo Google a partir de geolocalização. O professor do UniBH Bráulio Roberto Gonçalves Marinho Couto lembra que os números ajudam a entender os impactos das medidas de isolamento social no controle da pandemia.
Os dados se referem à mobilidade dos cidadãos em 16 países: Espanha, Áustria, Suíça, Itália, Israel, Bélgica, Holanda, França, Portugal, Alemanha, Reino Unido, Suécia, Turquia, Estados Unidos, Canadá e Brasil. A mobilidade é vista em diferentes categorias: entretenimento e recreação, que envolve cinemas e outras formas de lazer; farmácias e supermercados; parques; estações de transporte público; locais de trabalho e residência. Os números são de 5 de abril em comparação a cinco semanas anteriores, entre 3 de janeiro e 6 de fevereiro.
O Brasil teve redução de 67% nas atividades de recreação e 66% em relação à ida a parques. Menos do que outros países como Espanha, que teve redução de 94% em entretenimento e 90% em ida aos parques. O Brasil fica bem atrás dos países que já estão controlando a epidemia. Em termos de acréscimo do número de pessoas em casa, o Brasil teve 15%, bem aquém de Espanha (23%) e Itália (24%), Portugal (23%) e Israel (30%).
Os números de redução na frequência a cafés, restaurantes, shoppings e museus são mais expressivos na Espanha (94%), Áustria (82%), Suíça (76%), Itália (95%). A redução em frequência a farmácias e supermercados está na Itália (82%), Espanha (77%). A ausência em parques e praças tem destaque na Itália e Espanha, com redução de 90%, e Portugal, com 88%. A procura às centrais de ônibus e trens reduziu expressivamente na Espanha (89%), Italia (86%), Portugal (82%). No Brasil, a redução foi de 57%.
fonte: Márcia Maria Cruz -EM.com.br/reprodução 25/04/2020 - 13h:38min.

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