Mandetta quando estava no MS e Bolsonaro -foto:reprodução
No mesmo dia em que o Datafolha mostrou uma divisão entre os brasileiros sobre a responsabilidade do presidente Jair Bolsonaro por mais de 100 mil mortes por covid-19 no país até o momento, o ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta fez suas mais duras críticas ao ex-chefe. Em entrevista ao jornal britânico The Guardian, um dos mais importantes do mundo, Mandetta acusou Bolsonaro de levar os brasileiros a um desfiladeiro mortal por causa de seu egoísmo e sua posição anticientífica.
O ex-ministro, que foi demitido em abril após uma série de desentendimentos com o presidente, considera que Bolsonaro faz política com a morte de milhares de brasileiros.
Atualmente o Brasil soma mais de 106 mil mortes por covid-19, ficando atrás apenas dos Estados Unidos em número de casos e óbitos confirmados. Para Mandetta, Bolsonaro brincou de política com a vida dos cidadãos em meio a uma crise global.
"É interessante que ele rejeita totalmente a ciência e goza de todos aqueles que falam de ciência. Mesmo assim, quando há qualquer perspectiva de vacina, ele é o primeiro a bater na porta da ciência. Como se uma vacina fosse redimi-lo da sua marcha cambaleante pela epidemia", disse Mandetta.
O ex-ministro também comentou a forma fria com o que presidente tem tratado as mortes decorrentes do novo coronavírus no país. Bolsonaro fez referência aos recuperados, e não aos 100 mil mortos, no sábado passado, quando o país atingiu essa marca. Desde o início da pandemia, o presidente não visitou hospitais com pacientes infectados. Esse comportamento, na visão de Mandetta, pode indicar um sentimento de culpa.
"Ele conduziu o povo brasileiro para um desfiladeiro em marcha rápida e as pessoas caíram e morreram - e ter que reconhecer que isso foi um erro, que causou dor, acho que deve ser politicamente complicado para ele agora.” Ainda no início da pandemia, Mandetta alertou para o risco de colapso do sistema de saúde brasileiro e para um elevadíssimo número de mortos. Também defendeu a necessidade de isolamento social como medida preventiva, fazendo eco às posições da Organização Mundial de Saúde (OMS). Orientações que foram confrontadas pelo presidente e seus seguidores e que resultaram na demissão do então ministro.
Depois de uma breve passagem de seu sucessor, o médico Nelson Teich, o Brasil está há três meses sem um titular à frente da pasta. Até hoje o general do Exército Eduardo Pazuello atua como interino, mesmo não tendo experiência prévia em gestão pública ou saúde.
Para Mandetta, há uma "sabotagem absoluta" do Ministério da Saúde. O ex-ministro relatou ao jornal britânico que se sentiu angustiado e impotente diante de toda a situação que vivenciou e que Bolsonaro se cercou de pessoas que apenas concordam com ele, sem consultar especialistas.
O presidente, na visão dele, perdeu a "noção da realidade". Um dos conselheiros de Bolsonaro na área, o deputado e médico Osmar Terra (MDB-RS) previu, no início da pandemia, que o vírus mataria cerca de 2 mil pessoas no país.Número 50 vezes menor ao registrado até agora. Ex-ministro da Cidadania, Terra foi cotado para assumir o Ministério da Saúde. "Quando você está em uma situação em que se cerca de pessoas que dizem o que quer ouvir, e não o que é verdade...o líder acaba se cegando perante o que está acontecendo. Ele ouve, mas não escuta. Ele vê, mas não enxerga", disse Mandetta.
Para ele, a pandemia só vai arrefecer no Brasil com uma mudança de rumo no número de mortes diárias - cerca de mil por dia hoje. A continuar como está, a crise deve amenizar somente no fim de setembro, prevê ele.
Considerado como um possível candidato à Presidência ou vice em 2022, o ex-deputado do DEM de Mato Grosso do Sul acredita que o futuro chefe da nação terá o desafio de desanuviar o ambiente tóxico do atual governo e pacificar o país.
"Espero que o líder que saia vitorioso em 2022 seja capaz de reconstruir a fábrica social quebrada do Brasil dando ao país um senso de unidade... e aceitando que não é normal sair dizendo que brasileiros gostam de rolar no esgoto", declarou, em alusão à frase de Bolsonaro de que o brasileiro deveria ser estudado, pois mergulha no esgoto e não contrai nenhuma doença.
Nesta semana o presidente voltou a defender o uso da cloroquina, medicamento cuja eficácia no tratamento da doença nunca foi comprovada, como medida que poderia ter evitado, segundo ele, as mais de 100 mil mortes no país.
Pesquisa Datafolha divulgada neste sábado pela Folha de S.Paulo aponta que 47% dos brasileiros consideram que o presidente não tem qualquer culpa pelas mortes decorrentes da covid-19 no Brasil. Os que acham que Bolsonaro tem responsabilidade somam 52%: 11% os o veem como principal culpado e 41% avaliam que ele é um dos culpadaos, mas não o único, pela tragédia. O instituto ouviu 2.065 eleitores pelo celular, nos dias 11 e 12 de agosto.
fonte:Congresso em Foco - 15/08/2020
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