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A PFDC (Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão), órgão ligado à PGR (Procuradoria-Geral da República), pediu a abertura de uma investigação sobre o chefe da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência), Fabio Wajngarten, por possível apologia de crimes contra a humanidade.
Numa representação enviada à Procuradoria da República no Distrito Federal, que atua perante a primeira instância da Justiça Federal, o órgão requer a apuração e a responsabilização pessoal de Wajngarten, inclusive por suposta prática de improbidade administrativa.
O motivo é a publicação feita terça-feira (5) na conta oficial da Secom no Twitter. A postagem classifica como “heróis do Brasil” os agentes públicos que atuaram na repressão à Guerrilha do Araguaia, nos anos de 1970, durante a ditadura militar.
A divulgação foi acompanhada de imagem de encontro, ocorrido na véspera, entre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e Sebastião Curió, oficial do Exército brasileiro que chefiou a campanha de repressão no Araguaia.
A reunião não constou da agenda do presidente durante todo aquele dia, só sendo registrada à noite. Segundo a PFDC, o post propagandeia crimes cometidos durante a ditadura militar.
No documento, a Procuradoria aponta que o conteúdo é “uma ofensa direta e objetiva ao princípio constitucional da moralidade administrativa, por representar uma apologia da prática, por autoridades brasileiras, de já reconhecidos crimes contra a humanidade e graves violações aos direitos humanos”.
O órgão ressalta que o estado brasileiro, em diversos processos nacionais e internacionais, reconheceu oficialmente o desaparecimento de 62 pessoas no contexto da Guerrilha do Araguaia. Os militantes eram ligadas ao PCdoB.
Segundo arquivos guardados pelo próprio Curió, revelados em 2009 ao jornal O Estado de S. Paulo, as Forças Armadas executaram 41 militantes que já estavam presos e amarrados. Curió coordenou ainda, entre 1980 e 198, o garimpo de Serra Pelada, no Pará. Foi deputado federal e prefeito de Curionópolis (PA), cidade que ajudou a fundar.
“Todos os dissidentes capturados foram executados ou desapareceram, não sem que antes lhes fossem infligidos, sempre que possível, atos de violência física e moral a fim de obter informações. Especialmente nos casos de sequestro, além da perpetração de sevícias às vítimas para obter informação sobre o paradeiro dos demais dissidentes (tortura), seguiam-se atos de ocultação das condutas anteriores, visando assegurar a impunidade e manter o sigilo sobre as violações a direitos humanos”, destaca.
De acordo com a Procuradoria, ao sequestro clandestino segue a negativa estatal de sua própria ocorrência. “Essa negativa de informação, aliás, não cessou até hoje e configura um delito permanente”.
A representação aponta que “a ilicitude da conduta das Forças Armadas no enfrentamento à Guerrilha do Araguaia” foi objeto de demanda perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos, que, em 2010, emitiu sentença qualificando a prática do desaparecimento forçado de suspeitos por parte do Estado brasileiro como uma grave violação aos direitos humanos. “De mais a mais, em 2018, a mesma corte internacional afirmou que crimes dessa natureza são crimes contra a humanidade.”
A Procuradoria ressaltou que Curió foi “um dos mais brutais oficiais do Exército brasileiro”, tendo sido processado pelo desaparecimento forçado, qualificado como crime contra a humanidade, de Hélio Luiz Navarro de Magalhães, Maria Célia Corrêa, Daniel Ribeiro Callado, Antônio de Pádua, Telma Regina Cordeiro Corrêa, Divino Ferreira de Souza, André Grabois, João Gualberto Calatrone e Antonio Alfredo de Lima.
“A Secom do governo federal, portanto, ao celebrar e defender a repressão realizada pelas Forças Armadas na Guerrilha do Araguaia faz, como já adiantando, apologia da prática de crimes contra a humanidade e de graves violações aos direitos humanos, na contramão do Estado Democrático de Direito e dos princípios fundamentais da Constituição brasileira”, concluiu a Procuradoria.
Procurada nesta quarta (6), a Secom ainda não se pronunciou. A reportagem não conseguiu contato com Curió.
O documento informa também que a violência das Forças Armadas foi também direcionada contra a população civil da região, com a institucionalização de sistemáticas agressões físicas e psicológicas caso não fornecessem informações. “Houve, inclusive, o encarceramento de parcela expressiva dos moradores em verdadeiros campos de concentração, especialmente nas bases militares de Xambioá (TO) e Bacaba (PA).”
A Procuradoria acrescenta que foram narradas a ocorrência de torturas nos moradores presos em todas as bases militares e mesmo fora delas, como no momento da prisão, mediante espancamentos; o ato de pendurá-los de cabeça para baixo, pelos pés, dentro de um buraco; e também a prática suspender os homens pelos testículos e deixá-los em grandes buracos cavados no chão, com vários outros detidos.
fonte:Folhapress/fabio fabrini 06/05/2020
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