O farmacêutico Jonathan Pimenta tomou anti-inflamatório e corticoides, mas não conseguiu recuperar o olfato (Arquivo pessoal)
Já imaginou viver sem sentir o cheiro das coisas? Sem saber se o perfume usado é agradável, se tem alguma coisa queimando na cozinha ou se o botijão de gás está vazando? Pois é assim que vivem algumas pessoas que foram infectadas pela covid-19, doença causada pelo novo coronavírus, e que já se curaram, mas agora lutam contra as sequelas da doença. “Estou há três meses sem olfato”, reclamou o farmacêutico soteropolitano Jonatha Pimenta, 25 anos, que em maio foi contaminado.
O médico otorrinolaringologista Márcio Sampaio diz que a perda do olfato é um sintoma da doença e que é comum os pacientes demorarem até três semanas para recuperarem o sentido. “O coronavírus ataca as células sensoriais do olfato e do paladar, lesando-as e provocando a perda, que é reversível, pois essas células se regeneram em até 60 dias. Por isso, alguns casos mais extremos demoram dois meses para recuperação”, explica.
Márcio é mestre em saúde e ambiente de trabalho e professor do curso de medicina da UniFTC. Ele diz ainda que não é possível ‘bater o martelo’ e afirmar que sempre será possível recuperar o olfato e paladar.
“Essa é uma doença nova, que ainda estamos estudando. Agora, muitas pesquisas internacionais indicam que a maioria dos pacientes se recuperam”, acrescenta o especialista.
No caso de Jonatha, que há três meses não sente nenhum odor, o médico acredita que é preciso fazer uma investigação para entender se seu problema não está relacionado com outro fator. Em sua clínica particular, Márcio identificou um aumento de cerca de 3000% na procura por tratamentos relacionados ao problema. “Antes do coronavírus, atendia um cliente por mês com perda de olfato. Agora, são 30 por mês. Aumentou muito a quantidade de pacientes, pois esse é um sintoma comum para a covid-19", disse.
Jonatha foi uma das pessoas que buscou tratamento para recuperar o olfato, mas com outro médico. “Ele me passou remédios, anti-inflamatório e corticoides, mas não houve resultados. Agora estou fazendo treinamento olfativo com óleos essenciais. Fico cheirando as substâncias durante 20 segundos, duas vezes ao dia. Alguns produtos são mais fortes e já consigo sentir pouca coisa”, afirmou.
Como farmacêutico, Jonatha conhece bem os efeitos dos medicamentos que tomou (Foto: arquivo pessoal) |
O otorrinolaringologista Márcio Sampaio não é contrário a esse tipo de tratamento com óleos essenciais, mas afirma que o seu uso não acelera a regeneração das células sensoriais do olfato. “Não existe um tratamento específico. A gente tem que primeiro identificar a causa e dar tempo para as células regenerarem. Não existe algo para acelerar essa regeneração. A gente prescreve, geralmente, lavagens nasais com soro fisiológico e, às vezes, associamos corticóide tópico nasais”, exemplifica.
Outros casos
Esse também é o caso do operador de processos industriais Alan Santana, 30 anos, que após um mês sem olfato começou a sentir os odores mais fortes. “Meu maior medo é esquecer o gás aberto ou não sentir o cheiro de alguma substância perigosa, mas felizmente já consigo sentir essas coisas”, diz. Mesmo sem estar completamente recuperado, o rapaz não procurou tratamento específico para esse problema.
“Na consulta médica, me informaram que esses sintomas ainda estavam em estudo e que haviam casos relatados em que a volta à normalidade demorou 60 dias”, disse. Alan ainda não completou dois meses sem o olfato, mas disse estar se observando para que, quando completar esse prazo dado pelos médicos, esteja recuperado. “Posso dizer que meus sentidos estão calibrando”, acredita.
Alan espera recuperar completamente o paladar nos próximos dias (Foto: arquivo pessoal) |
Ao contrário de Jonatha, Alan relata também estar com perda de paladar. O médico Márcio Sampaio explica que as células sensoriais do paladar se regeneram mais rapidamente do que as do olfato. “As papilas gustativas regeneram em 14 dias. O problema é que o desempenho do paladar é dependente do olfato. Então, se há um comprometimento do olfato, o paladar já é afetado”, acrescenta.
Esse não foi o caso do estudante Reindy dos Santos Pereira, 19 anos, que nem foi testado para o novo coronavírus, mas teve a perda de olfato como único sintoma da doença. Quem explica a situação é a sua mãe, a dona de casa Maria de Fátima, 38 anos:
“Primeiro a irmã dele teve febre e dores no corpo. Cerca de 20 dias depois, ele perdeu o olfato. Liguei para o 155 - número do Telecoronavírus - e eles o orientaram a ficar em repouso e, caso sentisse mais algum sintoma, procurasse o posto de saúde. Como ele e ninguém mais da família apresentou outro sintoma, ficamos em casa. Só que a perda de olfato dele permaneceu” , revela Maria de Fátima
O filho de dona Maria ficou sem sentir nenhum odor durante um mês e vinte dias. “Só depois desse período que ele foi sentir cheiros mais fortes. Agora está voltando aos poucos, mas ainda não foi completamente. Felizmente, ninguém mais da minha família teve a doença”, afirma a matriarca.
Dona Maria está preocupada com a saúde do filho Reindy, mas espera que ele recupere logo o olfato (Foto: arquivo pessoal) |
Irreversível
Fabrizio Ricci, presidente da Academia Brasileira de Rinologia, ressaltou a importância de buscar tratamento precoce para o problema, evitando sequelas graves. Entre as opções, os pacientes podem fazer um treinamento olfatório, prescrito e acompanhado por um otorrinolaringologista, assim como o uso de medicações com efeito anti-inflamatório e manobras para diminuir a percepção de odores distorcidos ou a sensação de odores desagradáveis continuamente.
O médico destacou que, antes de definir um método terapêutico, é essencial uma avaliação completa do nariz e do olfato para que o tratamento seja o mais correto e efetivo para cada paciente.
"O impacto na qualidade de vida do paciente com anosmia, que é a perda total da capacidade de sentir cheiro, é significativo. Sem essa aptidão, a pessoa corre mais risco de acidentes domésticos, como não identificar o vazamento de gás de cozinha. Quanto mais cedo for iniciado o tratamento, maior a chance de sucesso”, explicou Ricci, em nota enviada à reportagem.
De acordo com o Ministério da Saúde, a perda de olfato é um dos sintomas mais comuns da doença. Apesar da ocorrência de diferentes quadros, a covid-19 ainda registra sinais mais recorrentes. São eles: tosse febre, coriza, dor de garganta, dificuldade para respirar, distúrbios gastrintestinais (náuseas/vômitos/diarreia), cansaço, diminuição do apetite e dispnéia (falta de ar).
fonte:Correio da Bahia - 05/08/2020 - 08h:41 min.
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